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Redução da meta não afeta credibilidade da gestão, avalia Canuto

27/07/2015 às 12h09

Investidores e analistas estrangeiros veem com bons olhos a mudança na orientação da política econômica e o programa de concessões em infraestrutura, mas mostram preocupação quanto ao impacto das denúncias e investigações relacionadas à Operação Lava-Jato sobre o investimento, segundo Otaviano Canuto, diretor-executivo do Fundo Monetário Internacional (FMI) para o Brasil e outros dez países.

Para Canuto, que assumiu o cargo no começo do mês, esse "talvez seja o grande desafio para a retomada do crescimento". Ele acredita que a redução das metas fiscais não afetará a credibilidade da gestão fiscal e que a chance de o Brasil perder o grau de investimento é muito baixa.

No momento, as empresas sob investigação nos "supostos esquemas cartelizados de repartição de mercado" enfrentam dificuldades de se financiar e de tocar programas de investimento, afirma Canuto. As companhias não envolvidas no episódio, por sua vez, ficam numa atitude de "esperar para ver". O resultado é que os investimentos desabam.

Canuto diz que os estrangeiros reconhecem o lado benigno das investigações, por indicar "o amadurecimento institucional" do Brasil, um processo que trará benefícios para a economia e para a gestão do país. No curto prazo, porém, há a preocupação quanto ao efeito sobre o investimento, "enquanto esse processo não alcança um patamar mais estável".

E o que poderia reacender o investimento estrangeiro e o doméstico? "Um sinal de que o processo se encaminha para uma normalidade, para uma situação de curso", avalia ele. "Que não se esperam novas surpresas, com a normalidade das instituições permitindo ao cálculo econômico voltar ao normal."

A redução das metas de superávit primário não preocupa Canuto. "Não creio que afete negativamente a credibilidade da atual gestão fiscal", afirma ele, para quem há o reconhecimento de que o ponto de partida inicial foi pior do que se esperava quando houve o anúncio das metas.

"Segundo, até por outros fatores, a desaceleração da economia e seu impacto sobre a arrecadação tributária têm sido também maiores que o esperado", diz Canuto, avaliando que a "mudança de direção" em relação ao saldo primário continua significativa. "É melhor ser realista." A meta de 2015 foi reduzida de 1,15% para 0,15% do PIB e a de 2016, de 2% para 0,7%.

Para ele, a probabilidade de perda do grau de investimento pelo país é muito baixa. Isso poderia ocorrer se o Brasil "esmorecesse no processo de ajuste", mas esse não parece ser o caso, afirma Canuto. Segundo ele, os estrangeiros veem a mudança na política econômica promovida neste ano com "alívio" e como algo necessário, que aponta na direção correta.

O economista afirma que os investidores e analistas externos têm elogiado a agenda anunciada pelo governo, como a "sintonia fina" em relação a concessões e a parceiras público-privadas (PPPs). A possibilidade de simplificação da legislação do ICMS também é bem vista, por tornar mais fácil o pagamento de tributos. "Isso permite uma melhora no ambiente, nos custos de fazer negócios no Brasil."

Ao falar da forte desaceleração da economia brasileira nos últimos anos, Canuto a atribui a três fatores. O primeiro é a perda de fôlego da economia global, com o Brasil bastante afetado pelos preços mais baixos de commodities. Outro ponto foi a complacência com a agenda de reformas estruturais, em especial durante o período de boom dos produtos primários.

"Isso quer dizer que o Brasil tem que aprender a poupar em tempos de vagas gordas, porque a época das vacas magras virá. Isso é inevitável em qualquer economia em que a produção de commodities tenha peso relevante", diz

Canuto, observando que há um espaço de tempo entre a implementação de reformas o seu efeito sobre a economia.

O terceiro fator, segundo ele, foi a " super-extensão da postura anticíclica pós2008", especialmente a fiscal e a para-fiscal, com a expansão do crédito via bancos públicos. A expectativa de que o sucesso obtido especialmente em 2010 pudesse ser repetido "deu resultados na margem decrescentes e até negativos". O lado benigno foi a preservação dos níveis de emprego, mas a superextensão da política anticíclica se exauriu. "Nós estamos vivendo o processo de ajuste em relação a ela."

Com a perspectiva de que o crescimento chinês e os preços de commodities não voltem a um nível favorável como o registrado há alguns anos, fica claro o peso e a importância da agenda de reformas, afirma Canuto. Um país como o Brasil precisa de mudanças que permitam a economia crescer mediante o aumento de produtividade, e "não por simples gravidade de preços de commodities favoráveis". A decisão da presidente Dilma Rousseff de buscar a melhora das relações comerciais com os EUA, um país que se recupera com mais força, é um passo acertado nesse cenário, segundo ele.

Para Canuto, a ausência de reformas estruturais foi generalizada nos países emergentes no período pós-crise, e é um dos fatores que explicam a perda de fôlego da maior parte dessas economias. A complacência também acometeu países como China, Índia, Rússia e Turquia. "De um certo modo, o sucesso na resposta à desaceleração das economias avançadas [em função da crise que se agravou em 2008] gerou uma certa complacência e uma certa inércia."

Canuto, que até junho era consultor-sênior para os Brics do Banco Mundial, vê a Índia como o "ponto brilhante" entre os emergentes, por ser o único país que se pode atribuir uma maior probabilidade de que as reformas ocorram, no governo do primeiro-ministro Narendra Modi. Segundo ele, se conseguir implementar determinadas mudanças no mercado de trabalho, a Índia poderá conseguir crescer "dramaticamente" num nicho em que a China enfrenta dificuldades crescentes, o de produção de manufaturas intensivas em mão de obra de baixa qualificação.




     


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