Compradores de médio porte são os protagonistas da nova onda de fusões no sistema financeiro
Por Cláudio Gradilone e Tatiana Bautzer
Com menos peças no tabuleiro, os bancos médios brasileiros voltaram a jogar o xadrez das aquisições. Depois de um período de retração, o mineiro BMG comprou o controle do banco paulista Schahin e tentou levar também o carioca Morada, que acabou sofrendo intervenção do Banco Central (BC), na última semana de abril. No início do mês, o pernambucano Gerador adquirira, do concorrente paulista Sofisa, o controle da promotora de vendas Rede Matriz, já rebatizada de Banorte Matriz. “Queremos financiar o pequeno varejo”, diz Paulo Dalla Nora Macêdo, presidente do Gerador.
Outro banco de São Paulo, o BicBanco, está lançando uma empresa de factoring em parceria com o banco europeu FIMBank e com dinheiro do Banco Mundial, e é visto como um potencial comprador de outras instituições. O carioca BVA, que apresentou um crescimento de quase 1000%, nos últimos cinco anos, também diz que quer mirar no mercado de crédito para as companhias de menor porte. “Nossa meta é concorrer com quem empresta para empresas pequenas”, diz Ivo Lodo, presidente e um dos maiores acionistas do BVA. O Paraná Banco, por seu turno, não descarta aquisições de instituições voltadas ao crédito para médias empresas. Ufa!
Ondas de consolidação não são uma novidade no sistema bancário. Nos últimos anos, a necessidade de escala gerou instituições financeiras cada vez maiores. No entanto, esse movimento é bastante diferente dos anteriores. Desta vez, os compradores de bancos médios são concorrentes do mesmo porte, e não os gigantes do varejo como Itaú, Bradesco e Santander. Além do Bic, Gerador, Paraná e BMG, o Fibra, pertencente ao grupo Vicunha, também é visto como um possível comprador. Em outras palavras: como diriam alguns advogados, trata-se de um processo de concentração interna corporis.
Paulo Macêdo, presidente do Gerador, quer financiar pequenas empresas
Há dois bons motivos para o movimento dessas novas peças no tabuleiro. O primeiro é que o ambiente para os bancos médios está mais hostil. Eles cresceram a partir de 2008, surfando nos pacotes governamentais de estímulo ao crédito. Com a retração dos empréstimos promovida pelo BC nos últimos meses, especialmente nas carteiras de crédito consignado e de veículos, eles têm de buscar novas fontes de lucro. O segundo motivo é que o capital para operar está mais escasso e mais caro. No auge da crise, o BC criou o Depósito a Prazo com Garantia Especial (DPGE), um título disponível apenas para os bancos e garantido até o limite de R$ 20 milhões. Se o banco quebrasse, o investidor não perderia.
Esse instrumento evitou um xeque-mate para várias instituições no auge da crise. No entanto, o sossego vai acabar. O limite para emitir DPGE será reduzido em 20% ao ano a partir do início de 20 12, até ser extinto em 2016. Sem ele, será preciso encontrar outros instrumentos para obter recursos de longo prazo, como as letras financeiras. Não por acaso, os custos do dinheiro para os bancos vêm subindo desde o início do ano, algo que se acentuou com a quebra do Morada. No mercado interbancário, as instituições médias vêm pagando cerca de 110% do juro de mercado medido pelo CDI em seis meses.
Renato Oliva, da associação de bancos, defende prazos maiores para normas do BC
Há outras causas. As regras vão ficar mais duras no ano que vem em relação a uma das principais formas de esses bancos captarem dinheiro: a venda de suas carteiras de crédito no mercado. Vai levar mais tempo para quem vendeu os empréstimos poder contabilizar os lucros. Além disso, esse negócio encolheu muito desde o início do ano. “O movimento nesse mercado estava muito intenso até a intervenção no PanAmericano”, diz David Kaddoum, sócio da administradora de recursos Atmos Capital, que investe mui to em ações de bancos. Depois do abalo sofrido pelo empresário Silvio Santos, os negócios encolheram abruptamente.
Os representantes do setor reclamam das novidades. “Tantas mudanças ao mesmo tempo são mais comida do que o prato suporta”, afirma Renato Oliva, presidente do Banco Cacique e da Associação Brasileira de Bancos (ABBC), que defende a extensão do prazo das medidas regulatórias, que já foi modificado outras vezes. Oliva sugere que os depósitos garantidos pelo governo continuem, mas com limite menor. “O momento é de transformação e temos que discutir se realmente queremos concorrência e a existência de bancos médios”, diz.
As razões para os novos contornos das aquisições, que passam ao largo dos QGs das instituições de maior porte, são simples. “Desde que o Itaú incorporou o Unibanco, comprar um banco com ativos totais de R$ 2 bilhões ou R$ 3 bilhões não faz mais diferença para a liderança”, diz o conselheiro de um dos bancões. A “vaidade” de liderar o ranking pesava muito no interesse por pequenas e médias instituições, acrescenta. Um executivo de um dos bancos médios concorda. “Atualmente faz mais sentido uma junção de forças entre os médios do que compra pelos grandes”, diz. “As maiores exigências de capital sobre os bancos médios estão estimulando a consolidação”, afirma Cristiano Malucelli, diretor de relações com investidores do Paraná Banco.
O Paraná Banco é visto como um dos compradores no novo cenário. O banco tem índice de capitalização de 32%, quase o triplo do mínimo exigido pelo Banco Central. A prioridade por enquanto é o crescimento orgânico, mas o banco também avalia oportunidades de aquisição. “Nosso alvo é o segmento de pequenas e médias empresas. Podemos avaliar se houver oportunidade de compra de um banco neste nicho”, afirma Malucelli.
Quem conhece o setor afirma que o novo desenho, depois que todas as pedras do tabuleiro tiverem sido movidas, será de bancos médios especializados em nichos, como o Paraná Banco, ou em regiões, como o Gerador. “Queremos ser um banco com muitos produtos, mas atuando na região Nordeste”, diz Macêdo, presidente do Gerador. “Nosso principal trunfo é o conhecimento da região, e não tem sentido para nós tentar concorrer com os bancos do interior de São Paulo.” A tendência é de que os peões médios fiquem mais concentrados em segmentos como o crédito a pequenas e médias empresas, e restrinjam as ambições em segmentos que exijam grandes estruturas de varejo para competir, como consignado e veículos.
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