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Envelhecimento global pode desvalorizar ações e títulos

08/10/2015 às 10h00

A mão de obra relativamente escassa poderá nas próximas décadas reverter algumas das últimas três grandes tendências: o aumento da desigualdade, a queda dos juros reais e dos salários. A consequência para os ativos poderá ser igualmente profunda, desafiando o lugar de destaque que os bônus soberanos têm nas carteiras de investimentos, assim como o valor das ações


O crescimento da China, a integração da economia mundial e a abertura de economias do leste europeu vêm coincidindo com o aumento da desigualdade econômica no mundo desenvolvido (e provavelmente também conduzidas por ele), e com a queda dos salários reais e das taxas de juros. Os beneficiados, conforme observado pelo economista francês Thomas Piketty, têm sido os donos do capital, com os juros em queda motivando retornos maiores dos bônus e lucros corporativos recordes.



Um novo estudo de economistas do Morgan Stanleyem parceria com o consultor Charles Goodhart, que já foi membro da comissão do Banco da Inglaterra que define os juros, afirma que aquilo que as tendências demográficas vêm motivando, elas também podem tirar. "Pikettyé história? Achamos que sim", afirmam Goodhart, Manoj Pradhan e Pratyancha Pardeshi no estudo divulgado em setembro. "Assim como uma força de trabalho maior derrubou os salários e aumentou muito a desigualdade nas economias avançadas, uma força de trabalho menor inevitavelmente levará a salários maiores, uma parcela maior da renda para a força de trabalho e uma queda de desigualdade."



O crescimento populacional, hoje em torno de 1,24% ao ano, cairá para 0,75% globalmente e chegará perto de zero no mundo desenvolvido até 2040, segundo projeções da Organização das Nações Unidas (ONU). Não só a oferta de mão de obra não aproveitada e facilmente integrada em lugares como a China está secando, como o envelhecimento do Ocidente exercerá pressões locais sobre a oferta de salários, uma vez que isso implica uma grande necessidade por trabalhadores na área de cuidados com a saúde.



A maioria dos economistas concorda que as taxas de juros vêm sendo derrubadas pelas tendências demográficas passadas, uma vez que os trabalhadores ocidentais não conseguiram negociar ganhos de salários, e devido às taxas de poupança muito altas da China e outras nações em desenvolvimento. Isso também deu às empresas ocidentais menos incentivos para investir, uma vez que o uso de mais mão de obra, ou mão de obra mais barata, prometia retornos melhores.



A demografia negativa deveria, em tese, reduzir o crescimento, a poupança ­ conforme os velhos vão consumindo seus ativos ­ e os investimentos. O estudo de Goodhart afirma que a poupança vai cair mais rapidamente que os investimentos, elevando as taxas de juros.
É justo observar que a análise do Morgan Stanley se baseia em algumas suposições que podem não se sustentar.



Primeiro a de que os países desenvolvidos vão responder aos acontecimentos demográficos mantendo as redes de segurança social e provisões de pensão, medidas que exigem vontade política para tributar e gastar. Segundo, há a questão misteriosa da tecnologia. Embora o argumento seja o de que as empresas responderão a trabalhadores mais escassos e mais caros investindo em tecnologias que dispensam mão de obra, não está claro qual força será
mais poderosa.



Muitos economistas vêm afirmando que a desaceleração demográfica será ruim para os preços dos ativos, em parte porque haverá menos compradores naturais poupando para a velhice e mais vendedores naturais financiando suas vidas na aposentadoria.
Acrescente a alta dos juros e dos salários a este cenário e os danos às grandes classes de ativos poderão ser substanciais. Um dos argumentos para os atuais preços elevados das ações é que as empresas gozam hoje de altas margens de lucro. Essas, porém, serão consumidas em parte pela alta dos salários, resultando em lucros menores.



As companhias poderão ter certo sucesso em segurar os salários por meio dos investimentos, mas isso tenderá a elevar mais os juros. Acrescente um crescimento econômico mais lento e teremos um cenário muito mais difícil para as empresas.
Como as taxas de juros têm um efeito poderoso sobre o valor futuro dos lucros esperados, é justo esperar que as ações serão negociadas com um prêmio reduzido como resultado da desaceleração demográfica.


O impacto da alta dos juros naturais também representa um problema para os bônus soberanos, que perdem valor à medida que as
taxas sobem. Toby Nangle, diretor de alocação multiativos da Columbia Threadneedle Investments, vem argumentando de maneira parecida com Goodhart e concluiu que os bônus soberanos poderão perder sua atratividade, e o lugar central que eles têm na formação da maioria dos portfólios.



Como muitos bônus soberanos já estão rendendo pouco, as perdas que os investidores sofrerão com a alta dos juros será particularmente dolorosa. A velha ideia de que os bônus "equilibram" o risco das ações ou de outros ativos ao longo dos ciclos do mercado poderá não se sustentar, levando os investidores a buscar retornos em outros lugares. Isso, é claro, exacerbaria a alta nos mercados de juros.



Os últimos 35 anos foram excelentes para o capital e ruim para o trabalho, pelo menos no mundo desenvolvido. Os próximos 15 poderão muito bem ser o contrário.


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