O crescimento da China, a integração da economia mundial e a
abertura de economias do leste europeu vêm coincidindo com o aumento da
desigualdade econômica no mundo desenvolvido (e provavelmente também conduzidas
por ele), e com a queda dos salários reais e das taxas de juros. Os beneficiados,
conforme observado pelo economista francês Thomas Piketty, têm sido os donos do
capital, com os juros em queda motivando retornos maiores dos bônus e lucros
corporativos recordes.
Um novo estudo de economistas do Morgan Stanleyem parceria com o consultor
Charles Goodhart, que já foi membro da comissão do Banco da Inglaterra que
define os juros, afirma que aquilo que as tendências demográficas vêm
motivando, elas também podem tirar. "Pikettyé história? Achamos que
sim", afirmam Goodhart, Manoj Pradhan e Pratyancha Pardeshi no estudo
divulgado em setembro. "Assim como uma força de trabalho maior derrubou os
salários e aumentou muito a desigualdade nas economias avançadas, uma força de trabalho
menor inevitavelmente levará a salários maiores, uma parcela maior da renda
para a força de trabalho e uma queda de desigualdade."
O crescimento populacional, hoje em torno de 1,24% ao ano, cairá para 0,75%
globalmente e chegará perto de zero no mundo desenvolvido até 2040, segundo
projeções da Organização das Nações Unidas (ONU). Não só a oferta de mão de
obra não aproveitada e facilmente integrada em lugares como a China está
secando, como o envelhecimento do Ocidente exercerá pressões locais sobre a
oferta de salários, uma vez que isso implica uma grande necessidade por
trabalhadores na área de cuidados com a saúde.
A maioria dos economistas concorda que as taxas de juros vêm sendo derrubadas
pelas tendências demográficas passadas, uma vez que os trabalhadores ocidentais
não conseguiram negociar ganhos de salários, e devido às taxas de poupança
muito altas da China e outras nações em desenvolvimento. Isso também deu às
empresas ocidentais menos incentivos para investir, uma vez que o uso de mais
mão de obra, ou mão de obra mais barata, prometia retornos melhores.
A demografia negativa deveria, em tese, reduzir o crescimento, a poupança
conforme os velhos vão consumindo seus ativos e os investimentos. O estudo de
Goodhart afirma que a poupança vai cair mais rapidamente que os investimentos,
elevando as taxas de juros.
É justo observar que a análise do Morgan Stanley se baseia em algumas
suposições que podem não se sustentar.
Primeiro a de que os países desenvolvidos vão responder aos acontecimentos demográficos
mantendo as redes de segurança social e provisões de pensão, medidas que exigem
vontade política para tributar e gastar. Segundo, há a questão misteriosa da
tecnologia. Embora o argumento seja o de que as empresas responderão a
trabalhadores mais escassos e mais caros investindo em tecnologias que dispensam
mão de obra, não está claro qual força será
mais poderosa.
Muitos economistas vêm afirmando que a desaceleração demográfica será ruim para
os preços dos ativos, em parte porque haverá menos compradores naturais
poupando para a velhice e mais vendedores naturais financiando suas vidas na
aposentadoria.
Acrescente a alta dos juros e dos salários a este cenário e os danos às grandes
classes de ativos poderão ser substanciais. Um dos argumentos para os atuais
preços elevados das ações é que as empresas gozam hoje de altas margens de
lucro. Essas, porém, serão consumidas em parte pela alta dos salários,
resultando em lucros menores.
As companhias poderão ter certo sucesso em segurar os salários por meio dos investimentos,
mas isso tenderá a elevar mais os juros. Acrescente um crescimento econômico
mais lento e teremos um cenário muito mais difícil para as empresas.
Como as taxas de juros têm um efeito poderoso sobre o valor futuro dos lucros
esperados, é justo esperar que as ações serão negociadas com um prêmio reduzido
como resultado da desaceleração demográfica.
O impacto da alta dos juros naturais também representa um
problema para os bônus soberanos, que perdem valor à medida que as
taxas sobem. Toby Nangle, diretor de alocação multiativos da Columbia
Threadneedle Investments, vem argumentando de maneira parecida com Goodhart e
concluiu que os bônus soberanos poderão perder sua atratividade, e o lugar central
que eles têm na formação da maioria dos portfólios.
Como muitos bônus soberanos já estão rendendo pouco, as perdas que os
investidores sofrerão com a alta dos juros será particularmente dolorosa. A
velha ideia de que os bônus "equilibram" o risco das ações ou de
outros ativos ao longo dos ciclos do mercado poderá não se sustentar, levando
os investidores a buscar retornos em outros lugares. Isso, é claro, exacerbaria
a alta nos mercados de juros.
Os últimos 35 anos foram excelentes para o capital e ruim para o trabalho, pelo
menos no mundo desenvolvido. Os próximos 15 poderão muito bem ser o contrário.
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