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Desigualdade de renda torna ricos mais mesquinhos
09/12/2015 às 10h11
Se a Londres vitoriana de Charles Dickens tivesse uma desigualdade de renda menor, Ebenezer Scrooge [personagem principal da história Conto de Natal] não teria sido tão avarento. Esta é a implicação de uma nova pesquisa que sugere que a desigualdade torna as pessoas ricas menos generosas. Publicado em novembro na "Proceedings of the National Academy of Sciences", esse é o primeiro estudo a investigar como a desigualdade influencia o altruísmo.
Algumas pesquisas anteriores feitas nos Estados Unidos observaram que os ricos são mais mesquinhos que pessoas com rendas mais modestas. Mas estudos realizados na Europa e no Japão não haviam constatado o mesmo.
"Isso era um enigma para nós", diz Stéphane Côté, professor da Rotman School of Management da Universidade de Toronto, que redigiu o estudo com colegas de Stanford e Toronto. "Por isso imaginamos que um fator que parece afetar os ricos é se eles vivem em um lugar de grande desigualdade em termos econômicos."
A equipe usou dados de uma pesquisa nacional feita com 1.500 americanos, chamada de Estudo de Avaliação da Moralidade. Este mediu a generosidade por meio de uma abordagem chamada de "jogo do ditador", que mostrou uma correlação com doações na vida real. Os participantes foram informados de que tinham dez bilhetes de loteria e teriam a oportunidade de transferir alguns deles para outro participante anônimo.
Quando classificaram os resultados pelos níveis de desigualdade dos estados americanos, constatou-se que as pessoas ricas dos estados com as maiores desigualdades se mostraram bem menos generosas que as pessoas dos estados onde a riqueza é mais bem distribuída. Eles olharam para os 15% do topo da distribuição de renda, ou as famílias que ganham pelo menos US$ 125 mil por ano.
Para validar as constatações, os pesquisadores recrutaram outras 700 pessoas pela internet. A esses participantes foram mostradas informações falsas que diziam que seus estados natais tinham maior ou menor desigualdade. Diante da mesma oportunidade de transferir bilhetes de loteria para outros, os ricos que acreditaram estar em estados de grande desigualdade de renda foram menos generosos que os mais pobres. A diferença desaparecia quando as pessoas eram informadas de que estavam vivendo em estados com uma distribuição de renda mais equitativa.
O que há por trás disso? Para os autores, concentrar a riqueza nas mãos de poucos pode levar à "crença de que um é mais importante e merecedor do que outros". Essa sensação de direito pode tornar os ricos menos altruístas e leva-los a "acreditar que os recursos lhes pertencem por direito". O estudo está sujeito às advertências usuais feitas às pesquisas sobre ciências sociais: experimentos como o jogo do ditador são ferramentas imperfeitas para entender o comportamento e intenções das pessoas. Nenhum estudo sozinho é a última palavra sobre qualquer questão.
As constatações são consistentes com um estudo não publicado que mostra que cortes nos programas de bem estar social, como o seguro desemprego, seguiram-se a um aumento da desigualdade no âmbito estadual, diz Lyle Scruggs, um cientista político da Universidade de Connecticut. "Se as pessoas no comando são ainda mais ricas, será que elas são menos propensas a cuidar dos menos favorecidos e, desse modo, têm uma mentalidade menos generosa?"
Isso também se alinha a uma ideia familiar sobre riqueza nos EUA. "Certamente há um fio narrativo na cultura americana de que as pessoas acabam onde merecem", diz Kim Weeden, que preside o departamento de sociologia da Cornell University e é diretora do Centro de Estudos da Desigualdade. "Uma conclusão é que se você está no topo da pirâmide de distribuição de renda, você merece estar lá", diz ela.
Se uma maior desigualdade significa menos caridade, "a lição mais óbvia é que precisamos criar um sistema que não dependa da generosidade e do altruísmo para garantir que as crianças terão comida suficiente, ou seja qual for o resultado que estamos tentando simular", afirma Kim. Em outras palavras, a sociedade não pode apostar que o tio Scrooge vai mudar suas maneiras. (Tradução de Mario Zamarian)
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