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Com Esteves na prisão, BTG-Pactual enfrenta saques e busca blindagem
26/11/2015 às 10h14
O banco BTG Pactual enfrentou ontem o pior dia de sua história, com forte movimento de resgates de investidores, principalmente nos fundos destinados a pessoas físicas. Na ausência de seu controlador, o banqueiro André Esteves, preso na manhã de ontem no âmbito da Operação Lava-Jato, os demais sócios do banco agiram rápido para tentar blindar a instituição e preservar ao máximo sua liquidez, cientes do risco que corriam.
Grandes investidores e executivos dos bancos que financiam o BTG começaram a receber logo cedo ligações dos principais sócios da instituição, como Roberto Sallouti, Marcelo Kalim e Persio Arida, que procuravam tranquiliza-los.
Transmitiram a mensagem de que o banco tinha um plano de contingência que passava a ser acionado naquele momento, que dispunha de liquidez da ordem de R$ 40 bilhões, e que estava aberto a prestar quaisquer esclarecimentos a clientes e parceiros de negócios.
Ainda pela manhã, decidiu-se por apontar o economista Persio Arida como CEO interino, no lugar de Esteves. O banqueiro, que telefonou para Sallouti logo depois da sua prisão para informa-lo do ocorrido e passar rápidas instruções, não participou da escolha de seu substituto. Um evento para clientes da área de gestão de fortunas na noite de ontem, no Rio, que seria aberto por Esteves, foi mantido, com a presença de Arida e do recém-apontado presidente do conselho do BTG no México, Guillermo Ortiz. Evento semelhante acontece hoje em São Paulo.
A estratégia de blindagem teve o claro objetivo de dissociar a imagem do banco da de Esteves, tarefa bastante dura, já que a figura do banqueiro se confunde com a do banco. "Infelizmente existe uma investigação sobre o Esteves, mas o banco não tem nada a ver com isso", disse um sócio a um interlocutor. "Ele é a face do banco, mas não faz tudo sozinho", completou.
O banco foi alvo ontem de inúmeras especulações envolvendo hipóteses de venda de seu controle para variadas instituições nacionais e estrangeiras. Um caminho natural, a depender do andamento das investigações que implicam o banqueiro, seria que os outros sócios relevantes assumissem a posição acionária de Esteves, alterando o controle do banco.
A frase mais repetida pelos sócios ontem era "business as usual", ou seja, que os negócios prosseguiam normalmente. Obviamente, não foi bem assim.
As units (ações) do banco perderam 21% do seu valor, fechando a R$ 24,40, mas chegaram a cair 38,9% durante o dia. Para dar sustentação aos papéis, o banco anunciou um programa de recompra de ações de até 18 meses. O preço dos bônus que vencem em 2020, um dos mais negociados, saiu de 91% do valor de face para 74%, queda de 18%. O "yield" (retorno ao investidor) saltou de 6,29% para 12,20% ao ano. O BTG Pactual tem US$ 7,4 bilhões em bônus globais. A maior parte dos vencimentos está concentrada entre 2020 e 2022.
A prisão de Esteves desencadeou uma série de ligações de clientes pessoa física às empresas que distribuem fundos do banco ao longo do dia de ontem, com dúvidas sobre os riscos para as carteiras e pedidos de resgate. Algumas distribuidoras relataram pedidos de resgates de até 30% do patrimônio alocado em fundos do banco.
Investidores institucionais ouvidos pelo Valor, por outro lado, se disseram dispostos a manter em carteira os papéis emitidos pelo banco letras financeiras e certificados de depósitos bancários, sem ou com garantia especial , ao menos num primeiro momento, até que possam avaliar melhor as consequências da prisão do banqueiro. "Vender agora significaria destruir valor para o investidor", disse o presidente de uma grande gestora de recursos que tem papéis do BTG em seus fundos. "Vender hoje [ontem] seria queimar o papel, pagando um prêmio altíssimo. Precisamos de mais elementos para avaliar e vamos monitorar diariamente", afirmou o presidente de um grande fundo de pensão.
Os assessores de investimento da Guide, que distribui fundos do BTG, ligaram aos investidores dos fundos de renda fixa da casa sugerindo substitui-los por carteiras de gestoras concorrentes, por precaução, apurou o Valor. A Guide negou em nota a recomendação. Já a XP Investimentos, que também distribui os fundos, mandou comunicado aos seus agentes autônomos orientando a não propagar pânico em relação ao banco. Clientes da XP têm R$ 700 milhões em fundos, CDBs e LCIs do BTG Pactual, sendo que 90% estão em fundos. Para um distribuidor que não quis ser identificado, ainda que o risco de solvência esteja descartado por ora, o BTG Pactual não deve ficar imune a uma onda de saques. "O risco de imagem é brutal, o cliente mistura tudo, entra em pânico e não quer se arriscar", disse.
O banco não quis comentar as informações. Segundo uma fonte que pediu anonimato, os resgates teriam vindo em volume menor do que o esperado pelo banco, embora ontem tenha sido o pior dia da história da instituição nesse quesito.
Para um experiente banqueiro, o BTG Pactual parecia estar se preparando para o que aconteceu ontem. "O volume em caixa estava muito alto", comentou.
O banco vem diminuindo a carteira de crédito desde o fim do ano passado e tinha R$ 40,9 bilhões em caixa e equivalentes no terceiro trimestre, além de outros R$ 99 bilhões em ativos financeiros, boa parte deles em posições líquidas, segundo duas fontes. Após a incorporação do banco suíço BSI, em setembro, a base de depósitos do BTG passou a ser formada principalmente por depósitos à vista, mais sensíveis a resgates, de acordo com o balanço mais recente. No fim de setembro, as captações do banco somavam R$ 162,6 bilhões, dos quais R$ 73,5 bilhões foram incorporados no terceiro trimestre do BSI.
Diferentemente dos papéis de dívida emitidos pelo banco, como bônus externos, CDBs e Letras Financeiras, que carregam risco de crédito do banco, os fundos de investimento geridos pelo banco têm seu patrimônio segregado.
No entanto, muitas dessas carteiras, carregam alguma dose de papéis do banco. O fundo multimercado BTG Pactual High Yield, por exemplo, com R$ 1,39 bilhão de patrimônio, tem 10,6% em papéis emitidos pelo próprio BTG Pactual, fora as debêntures de empresas em que o banco tem participação, como BR Properties. No caso do fundo Yield DI Crédito Privado, com R$ 5 bilhões, 6,2% do patrimônio está em depósitos a prazo e títulos emitidos pelo BTG.
Pelas regras da CVM, o fundo não pode alocar mais de 20% de seu patrimônio líquido em títulos ou valores mobiliários de emissão do administrador, do gestor ou de empresas a eles ligadas.
Alocadores e fundos de pensão já vinham tirando dinheiro das carteiras do BTG com maior exposição a crédito privado ou estudavam a migração há cerca de seis meses, segundo o Valor apurou, transferindo recursos, por exemplo, para as carteiras do próprio banco que compram apenas títulos públicos e operações compromissadas. Os fundos da casa são bastante disseminados no mercado, inclusive em plataformas de varejo, por conta de uma política agressiva da equipe de distribuição, que paga rebates fartos, de acordo com um alocador.
No, ano até outubro, os resgates em fundos geridos pelo BTG superam as aplicações em R$ 7,2 bilhões. Em 12 meses, a captação líquida está negativa em R$ 3,7 bilhões. O BTG é hoje o sexto maior gestor brasileiro, com R$ 143,6 bilhões de patrimônio.
A preocupação com a imagem do banco levou alguns gestores de recursos a repensar a manutenção do banco como administrador de seus fundos, ainda que não vejam riscos reais para o patrimônio. O BTG é hoje o quinto maior administrador do mercado, com R$ 179,5 bilhões, e tem crescido em fatia por meio de um trabalho agressivo de vendas. Somente neste ano, adicionou R$ 13,7 bilhões em valor administrado. O administrador é o responsável pelo fundo e suas informações perante os cotistas e os reguladores.
A qualidade dos serviços da administradora do BTG é bem avaliada pelo mercado, mas alocadores que preferiram não ser identificados relataram a cobrança de investidores de grande porte pela troca do prestador de serviço.
Uma fonte disse que já vem há seis meses substituindo o administrador dos seus fundos exclusivos e, no caso dos que têm administração do BTG, solicitou que o caixa seja feito em títulos públicos, sem exposição ao risco de crédito do banco.
O BTG enviou um comunicado aos clientes do serviço de administração em que ressalta a segregação entre o patrimônio do administrador e o dos fundos administrados. (Colaboraram Vinícius Pinheiro e Felipe Marques)
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