Últimas
Notícias
Brasil vai contra a realidade ao insistir em juros altos, diz Lara Resende
Fonte: FOLHA DE SÃO PAULO - 28/06/2017 às 10h06O Brasil está há mais de 20 anos, desde o Plano Real, com uma taxa de juros absurdamente alta, que causa perplexidade a todo mundo, mas economistas e gestores públicos continuam insistindo nisso, afirmou nesta terçafeira (27) o economista André Lara Resende, exdiretor do Banco Central e um dos formuladores do Plano Real.
"É aquela coisa da loucura: vamos insistir porque o que deve estar errado é a realidade e não a teoria. Teoria, não, regra de bolso", disse, durante debate sobre o seu novo livro "Juros, Moeda e Ortodoxia", no Insper.
No livro, o economista defende que os juros nominais podem ser sinalizadores importantes da inflação, conclusão que contratira a visão ortodoxa que enxerga os juros altos justamente como principal instrumento de combate aos preços altos. A obra tem causado discussões acaloradas e atraído muitas críticas.
Para Lara Resende, muitos economistas, quando vão fazer política pública ou política monetária param de pensar e passam a usar "regra de bolso."
Contando o caso de uma entrevista que deu recentemente, em que foi lembrado que juros mais baixos levaram à maior inflação alcançada nos últimos anos, durante o governo de Dilma Rousseff, Lara Resende disse que as pessoas se agarram a "raciocínios simplistas como se milhares de outras coisas não acontecessem simultaneamente."
"Já estávamos com recessão há dois anos e meio, 14% de desemprego, colapso no investimento, a economia completamente afundada e a inflação fixa. E se diz que a inflação caiu agora porque o juro subiu", disse ele, com ar de perplexidade.
Quando o atual presidente do Banco Central assumiu, afirmou, ele subiu um pouco os juros para, ato contínuo, começar a derrubálo. Segundo ele, é comum se assumir que a política do Banco Central derrubou a inflação. "Não estou dizendo que foi ou não. Mas isso não é passível de ser dito no olhômetro".
As duras críticas não foram feitas apenas aos juros elevados e à visão ortodoxa da política monetária. Diante de um auditório lotado por estudantes e também por figuras emblemáticas no meio, como o banqueiro Fernão Bracher e o exministro da Fazenda, Pedro Malan, Lara Resende não poupou o que chamou de "matematização excessiva" da macroeconomia.
"Macroeconomia hoje é uma brincadeira perigosa porque as pessoas usam a formalização [matemática] como espécie de legitimidade a opções políticas e dizem: 'não venha discutir comigo porque você não entende'".
E seguiu dizendo que "nada tem mais capacidade de impostura como um quadro cheio de equações."
Segundo ele, a barreira da matemática é usada para evitar discussões. "E quem sabe fala, 'não vou trair a
classe'".
Presentes ao debate, o presidente do Insper e colunista da Folha, Marcos Lisboa, e o economista e também colunista Samuel Pessôa apontaram o que sentiram falta no livro.
Para Lisboa, a discussão seria mais empírica, ou seja, mais focada no que se aplica ao comportamento da taxa de
juros e da inflação no caso específico, por exemplo, do Brasil.
Na mesma linha, Pessôa disse que, do ponto de vista empírico, há suporte sólido do modelo econômico tradicional, sem motivos para abandonálo.
Mas há uma concordância geral, disse Lisboa, de que o grande nó da política econômica é a questão fiscal.