Rombo de R$110 milhões em instituição carioca motiva primeira intervenção de autoridade monetária em seis anos
Marco Antônio Teixeira
Patrícia Duarte e Lucianne Carneiro
BRASÍLIA e RIO. Menos de um ano após a quase falência do PanAmericano, o Banco Central (BC) anunciou ontem intervenção na instituição carioca Morada, com mais de 40 anos. Há cerca de dois anos o BC detectou inconsistência financeira, como falta de provisões para créditos duvidosos, e desde então vinha conseguindo que os controladores reparassem as falhas. Mais recentemente, no entanto, isso não ocorreu por falta de fôlego dos donos e, assim, o rombo de cerca de R$110 milhões — mesmo valor de seu patrimônio líquido — não foi fechado.
Diante disso, o BC optou pela intervenção na instituição carioca, a primeira em seis anos. A última ocorrera em novembro de 2004 no banco Santos. O Morada tem apenas uma agência, localizada no Rio de Ja neiro, e cerca de mil clientes. Seus carros-chefes são a concessão de crédito consignado e os investimentos, como CDBs. Além do banco, o BC também decretou, por extensão, intervenção na Morada Informática e Serviços Técnicos, Morada Administradora de Cartões de Crédito e Morada Viagens e Turismo Ltda.
A autoridade monetária agora aguarda as informações da comissão de inquérito que foi instituída para vasculhar com lupa os dados do banco. O interventor nomeado é Sidney Ramos Ferreira.
Procurado no escritório do banco no Rio, Odílio Figueiredo Neto, que comandava o Morada, não retornou as ligações. O executivo é um dos vice-presidentes da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi).
Não está descartada a possibilidade de uma “solução de mercado”, com a venda do Morada para outra instituição, apesar de isso ser bastante difícil diante da frágil situação financeira da instituição. Chegou-se a especular que o BMG compraria o controle do banco carioca, mas acabou optando pelo banco Schahin, numa operação de R$230 milhões.
Garantia para os depósitos de até R$70 mil
Dentro do BC, existe a avaliação de que o Morada poderá, eventualmente, ser adquirido por algum grupo que queira entrar no mercado bancário nacional, mas não há apostas firmes de que isso vá, de fato, acontecer.
Os problemas do Morada também vão afetar o bolso de seus quase mil clientes, que correm sério risco de perder boa parte dos depósitos. Isso porque, em princípio, o Fundo Garantidor de Crédito (FGC) — entidade criada pelos bancos para assegurar parte dos depósitos em poupança, contas corrente e de investimentos, entre outros, em caso de quebra de uma instituição — somente arcará com 32% dos R$380 milhões do total de depósitos que o Morada possui, ou seja, R$121,6 milhões.
Essa é a fatia que está prevista na lei, que, entre outros, garante até R$70 mil para cada cliente por meio de depósitos à vista ou a prazo, como poupança, conta corrente ou aplicações em CDBs.
A retirada deverá ocorrer a partir de segunda-feira, dia 2 de maio. Nesta data, o cliente deverá buscar na página do FGC na internet (www.fgc.org.br) um formulário que repassa ao fundo os direitos aos créditos. Numa segunda etapa, o FGC nomeará um banco pelo qual o cliente do Morada retirará seu dinheiro. O restante dos depósitos, no limite, poderá fazer parte da massa falida se não for encontrada solução para a instituição.
O BC entende que, apesar do problema no Morada, o sistema financeiro nacional é bastante sólido e não apresenta riscos de solvência. No ano passado, o Banco PanAmericano, então controlado pelo empresário Sílvio Santos, quase quebrou devido a fraudes contábeis que chegaram a R$4 bilhões. No entanto, não houve intervenção porque as autoridades se esforçaram para encontrar uma solução privada.
Financiamento imobiliário foi origem da instituição
O FGC injetou os recursos necessár ios para evitar a falência do PanAmericano, que acabou comprado pelo BTG Pactual. Pouco antes de as fraudes serem detectadas, a Caixa Econômica Federal comprara participação no PanAmericano.
Criado em 1967 para atuar no financiamento imobiliário — na época do Banco Nacional da Habitação (BNH) — o Banco Morada vinha se destacando nos últimos anos principalmente na concessão de empréstimos consignados (com desconto em folha de pagamento) em convênios com INSS, Marinha, Aeronáutica, Exército, governos estaduais e prefeituras de grandes capitais. Além do consignado, o banco fazia operações de empréstimo pessoal e de empréstimo com garantia de veículo.
Apesar de ter apenas uma agência no Rio, o banco atuava por meio da rede da correspondente Morada Credi, com mais de 30 lojas próprias (dez no Estado do Rio), e parceiros em todo o Brasil, os chamados “zangões ou pastinhas”, que percorrem empresas e repartições públicas em busca de clientes e repassam os contratos para instituições de pequeno porte como o Morada. Ontem, a loja Morada Credi da Rua da Assembleia, no Rio, estava fechada.
Além do crédito para pessoas físicas, o banco vendia Certificados de Depósitos Bancários (CDBs, títulos emitidos por bancos) e concedia empréstimos para pequenas empresas. Em 2005, o Morada vendeu, por R$80 milhões, sua carteira de empréstimo pessoal e Crédito Direto ao Consumidor (CDC) para o Bradesco, além da rede de 33 pontos comerciais, sendo 15 no Rio, oito em São Paulo e dez nos demais estados.
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