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Risco fiscal cresce, mas PIB deve cair menos em 2020
Fonte: Valor Econômico - 20/08/2020 às 01h08
Enquanto pressões por aumento do gasto público ganham força no Brasil, alimentando a discussão sobre a sustentabilidade da dívida e turvando expectativas para a economia a partir de 2021, dados de atividade no segundo trimestre deste ano mostram desempenho menos negativo que o previsto e levam mais um grupo de economistas a trazer suas projeções para o Produto Interno Bruto (PIB) de 2020 para mais perto de -5%.
Ontem, a Capital Economics revisou sua estimativa de -7% para -5%, e o Credit Suisse mudou de -6,5% para -5,2%, um dia após a MB Associados alterar sua projeção de -6,4% para -5,3%. No fim da semana passada, Goldman Sachs e Barclays já haviam ajustado suas contas para -5%, enquanto a MCM Consultores e a Oxford Economics passaram a prever -5,4%.
“Temos argumentado que a atividade econômica poderia surpreender no lado positivo dado o alto nível de estímulos fiscais e monetários e a flexibilização das medidas de distanciamento social. Produção industrial, vendas no varejo e receitas de serviços apresentaram números melhores do que o esperado em junho. Dados de alta frequência sugerem continuidade da recuperação em julho e agosto”, escrevem os economistas Leonardo Fonseca e Lucas Vilela, do Credit Suisse. Segundo eles, a discussão agora é se a eventual retirada de transferências de renda “empurrará” a atividade para território negativo nos próximos trimestres.
No momento, o que se observa é o “crescimento acentuado” em segmentos que se beneficiam do auxílio, inclusive para a compra de bens que podem ser mais caros, entre materiais de construção, eletrodomésticos e móveis, o que levanta a possibilidade de aumento da inadimplência mais à frente, alerta Sergio Vale, economista-chefe da MB.
Mas a maior preocupação dos economistas parece dizer respeito mesmo ao cenário fiscal. O Citi Brasil fez, ontem, sua primeira revisão para cima no PIB brasileiro de 2020, mas ainda para -6%, ante projeção anterior de -6,5%.
Do lado negativo, os economistas Leonardo Porto e Paulo Lopes destacam a nova expectativa para a relação dívida bruta/PIB: 97,5% ao fim de 2020, vindo de 75,8% em 2019. Quanto mais tempo durar o distanciamento social, maior será a pressão para estender medidas de estímulo fiscal, afirmam eles. Assim, o controle da pandemia seria condição necessária para um plano de austeridade.
Discussões sobre expansão das despesas governamentais estão ganhando espaço tanto dentro como fora do governo, observam Porto e Lopes. Os principais riscos fiscais de longo prazo - que seriam o afrouxamento das regras e a prorrogação do estado de calamidade pública - “estão se tornando mais prováveis do que nunca.”
Embora o presidente Jair Bolsonaro e líderes do Congresso tenham reforçado o compromisso com a sustentabilidade fiscal, Porto e Lopes enumeram quatro fatores que apontariam em sentido contrário e merecem atenção: o nível de ociosidade na economia será enorme até o fim do ano; a popularidade de Bolsonaro parece ter aumentado com os estímulos ; marcadas para novembro, as eleições municipais podem mudar a visão dos parlamentares sobre o gasto público e, por fim, integrantes da equipe econômica saíram recentemente do governo, por verem pouco espaço para reformas.
Nessa conjuntura, estimam os economistas do Citi, o déficit primário deve ser de 13,6% do PIB em 2020. “Para o próximo ano, ainda assumimos que a política fiscal será restringida pelo teto de gastos”, dizem Porto e Lopes, ponderando que há riscos crescentes de que a regra seja flexibilizada em algum momento.
O cenário-base da Capital Economics também inclui aderência à austeridade fiscal em 2021, o que ajudaria a preservar juros baixos e confiança. “Mas isso viria a custo de uma demanda mais baixa”, escreve William Jackson, economista-chefe para mercados emergentes. É por isso que, após queda “relativamente modesta” do PIB neste ano, Jackson espera espera crescimento de apenas 3% em 2021 e 2% em 2022 - antes, a projeção era de 2,5% em ambos os anos.