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Relatório do BC alerta que 'efeito Amazonas' pode se espalhar pelo Brasil
Os efeitos da crise no Amazonas, avaliados em estudo do Banco Central, mostram como o recrudescimento da pandemia coloca em xeque a recuperação da economia, não apenas no estado ao norte do país, mas em todo o Brasil, por afetar principalmente o setor de serviços, o que mais emprega e que ainda não voltou ao nível pré-crise.
Os dados constam do Relatório Regional do BC, que trouxe um capítulo sobre a evolução da pandemia no Amazonas e seu impacto na economia, incluindo a comparação com os dados nacionais e também com o restante da região Norte.
“Os indicadores de alta frequência sugerem que a contração econômica ocorrida em janeiro no Amazonas tem magnitude similar à observada em abril de 2020, e que sinais de acomodação em patamar ainda baixo aparecem a partir da segunda semana de fevereiro”, diz o BC.
“Dadas as dinâmicas distintas de evolução da Covid-19 nos estados brasileiros, o caso do Amazonas sinaliza os possíveis impactos de um agravamento severo da epidemia em outras regiões”, afirma a instituição.
Segundo o estudo, as transações de bens e serviços efetuadas com cartão de débito registraram recuo de 13% na média móvel de sete dias até 10 de fevereiro, em relação ao mesmo período do ano anterior, com destaque para as contrações em vestuário e calçados (82%) e restaurantes e similares (54%), dois dos seguimentos mais afetados pela queda na circulação de pessoas.
O consumo de energia pela indústria local também despencou.
Nos demais estados da região, os dados foram positivos em praticamente todos os segmentos no mesmo período.
A instituição também mostra que o aumento de mortes e contaminação no Amazonas levou a uma nova queda na circulação por restaurantes, shoppings e cinemas, entre outros serviços de lazer.
Antes da nova explosão de casos, a circulação por esses locais estava acima do patamar pré-crise em todos os estados da região Norte. Depois, caiu mais acentuadamente no Amazonas, local mais afetado pelo recrudescimento da pandemia até o momento. Estava 47% abaixo do nível pré-crise no dado da média móvel de sete dias úteis até 12 de fevereiro.
A queda no restante da região e na média nacional foi bem inferior, 24% e 15%, respectivamente, no mesmo período, segundo o indicador de mobilidade Google Mobility, citado pelo BC.
Em nível nacional, o setor de serviços também mostrou um melhor desempenho antes da atual onda de aumento de contágio e morte, que ganhou força em fevereiro e março, deflagrando novas rodadas de isolamento social por todo o Brasil.
O IBGE informou que o volume do setor de serviços cresceu 0,6% em janeiro em relação a dezembro. A indústria também teve ligeiro crescimento (0,4% na comparação mensal), enquanto o comércio registrou retração de 0,2%.
A leitura agora é que, por causa do atraso no programa nacional de vacinação e da falta de ação do governo federal no combate ao coronavírus, a piora na crise sanitária vai comprometer os resultados dos três setores já em fevereiro, com possibilidade de números ainda piores a partir de março.
A CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo) diminuiu de 3,5% para 3,4% a expectativa de crescimento em 2021 e atribui a mudança, entre outros fatores, à lentidão da adoção de medidas de combate ao agravamento da pandemia do novo coronavírus.
“A tendência é que o setor de serviços consiga compensar apenas parcialmente a queda recorde de volume de receitas observada em 2020 (-7,6%), considerando um cenário de redução moderada dos atuais níveis de isolamento social até o fim deste ano”, afirma o presidente da entidade, José Roberto Tadros.
A necessidade de avançar no controle da crise sanitária para minimizar os efeitos econômicos da pandemia tem sido defendida por economistas do setor privado e também pela equipe econômica do governo federal.
Além de a piora na crise sanitária reduzir a circulação de pessoas, de forma voluntária ou não, ela aumenta a pressão por mais gastos em um momento de crise fiscal, como mostra a necessidade de se recriar o auxílio emergencial.
Como mostrou a Folha, o próprio presidente Jair Bolsonaro (sem partido) deu início a uma ofensiva, com foco na busca por vacinas, para tentar estancar perda de popularidade causada pelo aumento do número de mortes e pela tímida evolução na imunização da população contra o coronavírus.
Em evento recente, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, mostrou dados de Israel que apontam queda no número de mortes e internações após a vacinação de idosos e disse que isso reduz o medo das pessoas com o vírus e faz a economia voltar à normalidade mais rapidamente.
"Assim você retira o fator medo e as coisas voltam a funcionar", afirmou.
O ministro Paulo Guedes (Economia) também tem afirmado que a prioridade é “vacina, vacina e vacina” e que, sem vacinação em massa, a economia não se sustenta.
Reportagem da Folha do início do mês passado já mostrava que indicadores econômicos preliminares apontavam os efeitos do fim do auxílio emergencial e da piora na questão da saúde sobre o nível de atividade em janeiro.
Alguns desses indicadores mostram que a atividade continuou a perder força até o início de março, quando o agravamento da questão sanitária, antes mais restrito a algumas cidades, alcançou todo o país.
O Indicador de Atividade da Genial Investimentos, elaborado pela equipe do economista José Márcio Camargo, recuou em 12 dos últimos 14 dias. “O indicador aponta arrefecimento da atividade econômica desde o início do ano. Com o recrudescimento da pandemia, a tendência é que os indicadores de mobilidade urbana e número de voos domésticos continuem recuando nos próximos dias”, afirma a instituição, citando alguns dos componentes do índice.
O Idat (Indicador Diário de Atividade) do Itaú Unibanco ainda estava, no começo deste mês, 14% abaixo do nível verificado em meados de março de 2020, em uma situação praticamente de estabilidade desde outubro do ano passado.
Na sexta-feira (12), o banco revisou as projeções de crescimento da economia brasileira neste ano de 4% para 3,8% em 2021 e de 2,5% para 1,8% em 2022. A revisão se deveu à deterioração das condições financeiras resultante do aumento do risco fiscal.
Para o banco, a despeito do aumento do isolamento social, o impacto da questão fiscal sobre a redução do crescimento será menor em 2021 do que em 2022, em consequência do crescimento global robusto e do impulso vindo da vacinação neste ano.
"Ainda deve demorar alguns meses para que a imunização impacte de forma clara a dinâmica da pandemia. Além disso, o surgimento de variantes do vírus é um risco à eficácia das vacinas que tem que ser monitorado à frente", diz a instituição.