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PIB recua 4,1% e vê onda otimista ceder
A rápida recuperação da economia brasileira no segundo semestre não foi suficiente para evitar uma retração sem precedentes em 2020: duramente afetada pelas restrições à circulação especialmente no segundo trimestre, a economia encolheu 4,1% no ano passado, pior resultado da série histórica das Contas Nacionais do IBGE, iniciada em 1996. É consenso entre economistas que sem medidas como o auxílio emergencial o tombo teria sido bem maior. Para a primeira metade de 2021, a expectativa é de um desempenho negativo, devido à combinação de piora da pandemia, vacinação lenta, suspensão do auxílio e incertezas fiscais.
Mesmo tendo perdido fôlego após a retomada em “V” no terceiro trimestre, a economia mostrou desempenho ainda robusto nos últimos meses três meses de 2020, sustentada pelas políticas de compensação de renda do governo e, também, pela maior normalização das atividades no período. Impulsionado por esses dois fatores, o PIB superou as estimativas do mercado e cresceu 3,2% de outubro a dezembro na comparação com o trimestre anterior, feitos o ajuste sazonal.
Com o crescimento mais forte nos últimos meses do ano, o chamado carregamento estatístico deixado por 2020 foi um pouco mais alto do que o previsto, ficando em 3,6%. Isso significa que, se o PIB ficar estável, ainda assim encerrará o ano atual com alta de 3,6% sobre a média do ano passado.
Em condições normais, a ajuda maior poderia ter desencadeado revisões para cima nas projeções para o PIB neste ano, mas as mudanças nas estimativas, que seguem concentradas na faixa de 3%, foram poucas e bastante tímidas. Diante do recrudescimento da pandemia, da lentidão na vacinação e da piora nas condições financeiras, muitos analistas esperam queda da atividade no primeiro trimestre.
Uma nova retração no segundo trimestre - que configuraria uma recessão técnica - não é considerada totalmente contratada. Esse risco, contudo, ronda o primeiro semestre, e pode se materializar se o aumento de casos e mortes continuar, sem melhora na administração de vacinas.
“A gente ainda está um pouco abaixo do nível pré-pandemia, mas já estamos acima do vale do pior momento da economia, que foi o segundo trimestre”, afirmou Rebeca Palis, gerente de Contas Nacionais do IBGE, ao apontar que o PIB está em patamar 1,2% inferior ao quarto trimestre de 2019.
“Uma onda de otimismo estava sendo formada no quarto trimestre, mas ela ficou para trás”, disse Emerson Marçal, coordenador do Centro de Macroeconomia Aplicada da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (Cemap-EESP/FGV). A economia estava ganhando ritmo no fim do ano passado, aponta Marçal, o que seria positivo, não fosse a segunda onda da pandemia a atingir o país neste primeiro trimestre.
A demanda doméstica - que soma o consumo das famílias, o consumo do governo e os investimentos dentro do PIB - mostrou comportamento ainda favorável nos últimos três meses de 2020, observou Tatiana Pinheiro, economista-chefe da BNP Paribas Asset Management . Em seus cálculos, a absorção interna subiu 5,8% sobre o trimestre anterior, ou 4,3% excluindo a importação contábil de plataformas de petróleo.
“Tivemos um quadro de demanda ainda forte. Além do auxílio emergencial, houve a influência de todos os demais programas que ainda estavam vigorando no quarto trimestre, com políticas de expansão fiscal e monetária”, afirmou Tatiana. Outro fator que explicou a dinâmica positiva foi o arrefecimento da covid-19 e a consequente reabertura maior das atividades, acrescentou. Neste início de ano, porém, o quadro se inverteu, ressaltou Tatiana: a maior parte dos estímulos foi retirada e a pandemia se agravou, o que aponta para queda do PIB de janeiro a março, entre 0,5% e 0,8%. Além disso, o aperto das condições financeiras, como reflexo do aumento da percepção de risco-país, também tem impacto negativo sobre a atividade, ao afetar as decisões de investimento e consumo.
Levando em consideração apenas o desempenho do quarto trimestre, a herança estatística deixada por 2020 elevaria a estimativa para o crescimento deste ano em cerca de 0,7 ponto percentual, calcula a equipe econômica para Brasil do J.P. Morgan. No entanto, o banco avalia que o recrudescimento da pandemia e seus efeitos sobre a economia devem anular boa parte da ajuda dada pelo carregamento estatístico. Por isso, a projeção para a alta do PIB em 2021 foi aumentada em somente 0,1 ponto, para 3,2%.
“Com uma segunda onda severa de covid e aumento da incerteza política, a economia deve se enfraquecer significativamente, o que deve reduzir o crescimento no primeiro e no segundo trimestres”, destacaram os economistas Cassiana Fernandez e Vinicius Moreira. Para a instituição, o PIB vai cair 1,5% entre janeiro e março, retração a ser seguida de alta fraca, de 0,4%, no trimestre seguinte.
Os riscos políticos e da pandemia justificam a preocupação com a recuperação deste ano, na visão de Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, que agora trabalha com contração de 0,9% e 0,4% da economia no primeiro e no segundo trimestres, respectivamente. A previsão abaixo do consenso de crescimento para o ano, de 2,6%, não foi alterada.
O cenário da consultoria, disse Vale, engloba um primeiro semestre afetado pela pandemia e um segundo semestre influenciado pelos desdobramentos de um governo mais intervencionista, com impacto em câmbio, inflação, juros e investimento. O economista ressaltou, ainda, que o carregamento estatístico de 3,6% pode ser enganoso: nos últimos 25 anos, lembra, em oito deles o resultado do ano foi pior do que essa herança indicava, em torno de 1,4 ponto percentual.
Já o economista Luka Barbosa, do Itaú Unibanco, avalia que o efeito estatístico será relevante para explicar o crescimento estimado de 4% para o PIB em 2021. O banco é uma das poucas instituições que contam com alta da economia no primeiro trimestre, de 0,3%, previsão ainda preliminar. “Para o PIB ser negativo no primeiro trimestre, a produção industrial teria de cair bastante em janeiro, fevereiro e março e não vemos isso ocorrendo.”
Para Tatiana, da BNP Paribas Asset, o “carry over” coloca um leve viés de alta na projeção de expansão de 2,8% para o PIB no ano. O quadro, porém, é de cautela, diz ela, diante das condições financeiras mais apertadas e da evolução da pandemia. Por isso, por ora, o número está mantido.