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Mercado vê que por enquanto risco fiscal é maior com Lula do que com Bolsonaro
Para participantes do mercado financeiro, um novo governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva representa um maior risco à saúde fiscal do país do que a continuidade de Jair Bolsonaro (sem partido) na Presidência. Pelo menos, neste primeiro momento.
Uma eventual disputa entre o petista e o atual presidente entrou no radar com a decisão do ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal), de anular as condenações contra Lula pela 13ª Vara Federal da Justiça Federal de Curitiba, o que dá ao ex-presidente o direito de se candidatar nas próximas eleições.
Como não está definido se Lula será mesmo candidato em 2022, muito menos qual será sua plataforma de governo e equipe econômica, analistas dizem que ainda é cedo para avaliar qual candidato é preferível em termos econômicos.
A aposta, por ora, é que o petista adotaria uma política populista que levaria o país a um aumento de gastos públicos.
Por outro lado, a continuidade do ministro Paulo Guedes (Economia) no governo Bolsonaro traz uma certa segurança entre investidores de que a responsabilidade fiscal não será abandonada e o teto de gastos continuará preservado.
"Por enquanto, o mercado não desembarcou do governo Bolsonaro, especialmente por Guedes, que tem as reformas no radar e passa muita confiança. Se o ministro sair, muda muito", diz Daniel Herrera, analista da Toro Investimentos.
Segundo Herrera, se as reformas não andarem e se novos nomes ao entorno de Guedes –como o presidente do Banco do Brasil, André Brandão– saírem, o apoio ao governo se esvai.
A agenda liberal de Bolsonaro está na corda bamba desde que o presidente interferiu na Petrobras, indicando o general Joaquim Silva e Luna para substituir o atual presidente da empresa, Roberto Castello Branco.
“Bolsonaro disse que não ia interferir na economia e não foi isso que aconteceu. Já vimos que ele não é muito adepto do liberalismo econômico. Bolsonaro por Bolsonaro é complicado”, diz Camila Abdelmalack, economista-chefe da Veedha Investimentos.
Ela frisa, contudo, que atualmente insatisfação não é flerte com governos passados.
"No momento, Bolsonaro é a melhor opção [do que Lula], sem dúvidas, pelo que precisa ser feito em termos de agenda econômica. Ele é preferível a Lula desde que mantenha uma equipe econômica que garanta responsabilidade fiscal", afirma Camila.
Analistas não descartam, porém, a possibilidade de Lula adotar um tom mais conciliador e de preocupação com as contas públicas, como na eleição de 2002.
Em junho daquele ano, o petista se comprometeu com a saúde fiscal do país por meio da Carta ao povo brasileiro, que mencionava reformas, queda na taxa de juros, controle da inflação e recuperação da capacidade de investimento público.
O documento acalmou os ânimos do mercado financeiro à época.
“O mercado está reeditando o medo de 2002, mas é curioso que o mercado não tenha reeditado que o primeiro governo Lula teve um compromisso fiscal maior até que o de FHC", diz Fernando Ribeiro Leite, o professor de economia do Insper em referência ao governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002).
Leite diz, porém, que no segundo mandato de Lula, após a crise financeira de 2008, a política fiscal foi mais frouxa.
O economista vê, no momento, um risco maior em um segundo mandato de Bolsonaro para o sistema financeiro do que em um novo mandato de Lula, com base no histórico de ambos no poder.
“A política macroeconômica foi sólida no primeiro governo Lula, muito melhor que a de Bolsonaro e Guedes, que não fazem nada”, diz Leite.
Ele vê Bolsonaro como um Kirchner à direita, em referência aos presidentes peronistas da Argentina Néstor Kirchner (2003 a 2007) e Cristina Kirchner (2007-2015), com um desvirtuamento não para os pobres, e sim para sua base, com destque para os militares.
Apesar de ter um histórico econômico favoravel, Lula é visto com medo pelo mercado por herança indireta do governo de Dilma Rousseff (2011-2016), marcado por grande interferência na economia, aumento no endividamento do setor público e uma forte recessão.
“Lula é uma coisa e Dilma é outra. Palocci e Lula eram mais pragmáticos. Eram. Hoje eu não sei”, afirma o professor.
Antonio Palocci foi ministro da Fazenda no governo Lula até o início de 2006 e ministro da Casa Civil nos primeiros meses do governo Dilma. Ele foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro em junho de 2017 pelo então juiz Sergio Moro, quando responsável pelas ações da Lava Jato em Curitiba.
Com a possibilidade de Lula disputar as eleições presidenciais, o mercado também espera uma maior polarização política e teme uma resposta populista do governo Bolsonaro, elevando gastos públicos e a dívida do governo.
"O problema não parece nem Lula, mas, sim trazer a discussão eleitoral para agora, o que pode contaminar a pauta no Congresso", afirmou Victor Scalet, estrategista macro e analista político da XP.
O temor de que haverá a mistura desses riscos no curto prazo repercutiu com força no mercado financeiro no pregão de segunda (8). Nesta terça (9) o Ibovespa fechou com ganhos de 0,65%, a 111.330,62 pontos, após cair cerca de 4% na véspera.
As ações da Vale, todavia, cederam 1%, com o tombo de quase 10% dos futuros do minério de ferro na China, com restrições à produção no polo siderúrgico de Tangshan em meio a medidas antipoluição impactando esperanças de uma retomada na demanda.
Preocupações com o risco de nova desidratação da PEC Emergencial, que também pesaram no pregão de segunda, porém, foram de certa forma amenizadas nesta sessão, ajudando a Bolsa e o real.
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), afirmou que a ideia do relator da PEC Emergencial, deputado Daniel Freitas (PSL-SC), é manter com pouca ou nenhuma alteração o texto da proposta que veio do Senado.
A previsão é que a admissibilidade da PEC Emergencial seja votada pela Câmara nesta semana.
No exterior, os juros dos títulos do Tesouro dos Estados Unidos caíram e endossaram a compras de ações, especialmente as de tecnologia, que tiveram dortes quedas nos últimos pregões.