Clipping
Fundo de crédito cresce e deve ter melhor captação mensal desde 2020
O momento de incerteza no cenário local, que afasta o investidor de ativos mais arriscados, e o ciclo de alta de juros em curso têm dado corpo ao fluxo destinado à renda fixa. Os fundos de crédito vêm crescendo e caminham para fechar setembro com o melhor desempenho mensal em termos de captação desde, pelo menos, o começo de 2020.
A dinâmica favorável desse mercado também se traduz em um forte volume de emissões - cujos prazos têm, inclusive, se ampliado. Mas a queda dos spreads dos papéis é uma demonstração de que a demanda cresce a um ritmo ainda mais intenso. Dinâmica que, na opinião dos especialistas ouvidos pelo Valor, tende a prosseguir nos próximos meses.
Dados da Anbima mostram que, em agosto, o mercado de renda fixa captou R$ 34,1 bilhões, o segundo melhor desempenho mensal do ano. Desse total, as debêntures contribuíram com R$ 20,3 bilhões, elevando o volume no ano para R$ 140 bilhões. Mas, quando se olha para os fundos de crédito, fica claro que o mercado ganhou dinamismo.
Levantamento feito pela JGP junto aos 152 fundos de investimento que têm pelo menos 50% de seu patrimônio investido em crédito mostra que, em setembro até o dia 17, a captação líquida ficou em R$ 11,748 bilhões. Em todo o mês de agosto - até então, o melhor mês de 2021 - os fundos captaram R$ 13,258 bilhões. Segundo mostra a JGP, esse universo de fundos de crédito ingressou em um período de captação líquida em fevereiro deste ano. Até então, o que se via era uma onda de saques, que foi iniciada em 2020, período em que o impacto da crise gerada pela pandemia levou a uma queda da taxa Selic para 2% e contribuiu para um desequilíbrio no mercado secundário de renda fixa.
“Temos visto os fluxos se acelerarem, o que se reflete em uma queda importante do spread dos papéis”, explica Alexandre Muller, da JGP. Para fazer o acompanhamento do desempenho do segmento de crédito privado, a JGP criou o índice IDEX-CDI. O indicador mostra que, em agosto, o spread médio dos papéis negociados no mercado ficou em 1,68%, o menor nível desde março do ano passado. Em abril do ano passado, auge da pandemia - e em um momento em que o mercado de crédito privado perdeu funcionalidade, dada a forte queda da Selic -, ele atingiu 4,68%. O spread iniciou o ano acima de 2,10% e vem declinando desde então, reagindo à demanda pelos ativos de renda fixa. Mas, ainda assim, o nível segue bem acima do auge desse mercado, no fim de 2019, quando estava negociado ao redor de 1,28%.
Segundo Odilon Costa, analista de renda fixa e crédito privado do BTG, a alta da taxa Selic, que caminha para superar o nível de 8% até o fim deste ano, de acordo com a projeções de mercado, é, sem dúvida, um dos principais elementos a justificar o fluxo destinado ao mercado de crédito privado. “Há uma migração da renda variável para a renda fixa, provocada pelas revisões para a taxa Selic. Mas esse movimento ainda não acabou, acredito que ainda tenha um fluxo grande para entrar”, diz.
Embora sejam as debêntures indexadas ao CDI as que mais atraem o investidor em momentos de alta de juros e também de incerteza - dado que o CDI acompanha de perto a evolução da Selic -, há sinais de crescimento também dos papéis indexados ao IPCA, ainda que a um ritmo bem mais branco.
Segundo dados da Anbima, os papéis atrelados ao índice de preços representaram 24,7% de todas as emissões realizadas entre janeiro e agosto deste ano, contra 15,8% em igual período de 2020. Já as debêntures indexadas ao CDI responderam por uma fatia de 66,1% das emissões, ante 73% em igual período do ano passado.
“Há uma demanda forte por parte de fundos, mas também de pessoas físicas, que sentem o efeito da alta da inflação e buscam se proteger”, diz Felipe Bottino, diretor de Investimentos do Banco Inter. A pessoa física tem o atrativo adicional de ser isenta de Imposto de Renda no caso das debêntures incentivadas.
Do lado dos emissores, o interesse do mercado pela renda fixa contribui para colocações maiores e mais longas. Mas também há um movimento de antecipação de operações, observa Bottino, do Inter. “Ano que vem tem muita incerteza, então quem pode faz a antecipação do seu ‘cash flow’”, afirma.
Para Pierre Jadoul, gestor de crédito privado da ARX Investimentos, a dinâmica muito positiva desse mercado pode começar a justificar algum cuidado. Ele diz que, embora os spreads dos papéis ainda estejam acima do que se viu em 2019, ano de euforia desse mercado, o risco é que os fundos comecem a alongar excessivamente seus prazos buscando melhores rendimentos. “Os spreads se comprimiram muito e o risco é que os gestores baixem a régua de crédito buscando prêmios mais altos.”