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Como será o processo de decisão do Copom?

Fonte: Valor Econômico - 03/12/2021 às 05h12

Muitos analistas econômicos acharam confusas as explicações dadas anteontem pelo diretor de política econômica do Banco Central (BC), Fabio Kanczuk, sobre como será o processo de decisão de juros pelo Comitê de Política Monetária (Copom) em reunião na semana que vem. 

Mas um exame mais detalhado mostra que Kanczuk apenas explicou, usando palavras teoricamente mais simples, o que já estava oficialmente comunicado na ata de outubro do Copom.
Kanczuk procurou inverter a lógica que estava na cabeça de muitos analistas: de que uma eventual redução na ênfase do colegiado na meta de inflação de 2022, deslocando o foco para 2023, significa que o BC será mais suave na política monetária. Na verdade, segundo ele, o Copom faz o contrário. Primeiro, decide o quão duro precisa ser na alta dos juros para controlar a inflação, para apenas depois decidir se coloca mais ou menos foco na meta de 2022. 

Foi exatamente esse o processo decisório na última reunião do Copom, de outubro, segundo a ata daquele encontro. Primeiro, o Banco Central decidiu o grau apropriado de aperto monetário, conforme descrito no parágrafo 13 do documento. O passo seguinte foi definir o ritmo de aperto monetário. Esse processo, detalhado no parágrafo 14 da ata do Copom, considera diferentes trajetórias de política monetária. Na reunião de outubro, foi escolhida a que garantia levar a inflação para a meta em 2022. 

Muitos economistas experientes do mercado fizeram uma interpretação mecânica desse processo. Se o BC continuar focando na meta de 2022, o grau de aperto monetário teria que ser maior. Para tanto, seria necessário intensificar o ritmo de alta da Selic para dois pontos percentuais por reunião, já que restam apenas três reuniões com influência significativa na inflação do ano-calendário de 2022. 

O processo de decisão do grau de aperto monetário, porém, é diferente. Pelo que está indicado na ata de outubro, o Copom primeiro vai fazer projeções de inflação para os próximos anos, dentro do cenário básico, e ver se elas estão acima ou abaixo da meta no horizonte relevante. Em dezembro, esse horizonte dá igual peso aos anos-calendário de 2022 e 2023. Mas, na reunião de fevereiro, a média móvel das metas de inflação caminha adiante, e o BC estará 25% focado na meta de 2022 e 75% focado na meta de 2023.

Em outubro, o BC estimou a inflação de 4,1% em 2022 e 3,1% em 2023, pressupondo que o juro subisse a uma máxima de 9,75% ao ano. Agora, o mercado prevê um pico de juros de 11,25%, mas uma inflação maior, de 5% em 2022 e de 3,42% em 2023. É provável que a projeção do BC tenha subido também, já que ela costuma andar na mesma direção que as estimativas de mercado. 

Uma dúvida relevante nas projeções é se a autoridade monetária vai incorporar uma taxa de juro neutra maior. O BC indagou as estimativas do mercado no questionário pré-Copom. Mas dirigentes do BC, como o próprio Kanczuk, pareciam ter pouco apetite por modificar a estimativa atual do BC, de 3% do ano reais. 

O passo seguinte para definir o grau de aperto monetário é ponderar a inflação projetada no cenário básico pelo balanço de riscos para a inflação. Em outubro, o Banco Central reconheceu uma piora no risco fiscal. Assim, ao definir o grau de aperto monetário, deu um peso maior a uma projeção de inflação mais alta num cenário alternativo de descontrole fiscal. 

Não há indicações de que, de outubro para cá, na visão do BC, os riscos fiscais tenham se deteriorado ainda mais. O presidente da instituição, Roberto Campos Neto, deu algumas declarações de confiança num bom desfecho no imbróglio. Ou seja, conta com um drible limitado do teto de gastos, acompanhado da boa comunicação de um arcabouço fiscal sólido. 

Mas Kanczuk mencionou anteontem que a desancoragem das expectativas de inflação de longo prazo, ocorrida no último mês, representa uma “camada” a mais de risco que, possivelmente, será considerada na definição do grau apropriado de aperto monetário. “Quando você tem o risco de desancoragem das expectativas, é como se tivesse uma segunda meta além da meta tradicional de colocar a inflação na meta”, disse. 

Uma vez definido o grau apropriado de aperto monetário, a discussão passa para o ritmo de aperto adequado. O parágrafo 14 não dá muitos detalhes sobre esse processo, além do fato de que o Copom analisa diversas trajetórias diferentes de juros para implementar o grau de aperto desejado. Lá, o BC menciona as incertezas nas projeções de inflação para 2022 e o risco de desancorar as expectativas de longo prazo. O texto é meio confuso, porque dá a entender que o risco de desancoragem determina o ritmo de alta, quando deveria ser o grau de aperto adequado. 

De qualquer forma, é bom notar que, pelo que já disseram anteriormente autoridades do BC, o grau de aperto é determinado tanto pelo ritmo de alta de juros quanto pelo orçamento total. Ou seja, a taxa de juros final no ciclo de aperto. 

Altas de juros num ritmo mais forte aumentam o juro médio e, assim, influenciam o grau de aperto. Isso também pode ser alcançado, em tese, com um prolongamento do ciclo, sem alterar o ritmo de alta. Ou com uma combinação de intensificação de ritmo e prolongamento do ciclo de aperto. 
Dessa forma, o foco, a ferro e fogo, na meta de 2022 foi resultado de uma determinada trajetória de juros. Não sinaliza o grau de aperto. O grau de aperto é determinado pelo desvio da inflação esperada (ponderação entre projeções no cenário básico e nos alternativos) em relação às metas de 2022 e 2023. 

Dirigentes do BC vêm afirmando que estão revendo esse foco excessivo na meta de 2022, o que parece indicar que estão menos dispostos a intensificar de novo o ritmo de aperto monetário, caso a análise das projeções de inflação e balanço de riscos exija um grau de aperto maior. Se for o caso de mais aperto - Kanczuk não deu pistas se vai realmente ser preciso mais -, a variável de ajuste que resta, provavelmente, é o tamanho do ciclo de alta da taxa Selic.

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