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Com Nubank, Creditas reforça ecossistema de crédito
Quando o valenciano Sergio Furio fundou o que hoje é a Creditas, em 2012, ninguém falava em fintechs. Então chamada de BankFacil, a empresa era só um comparador de produtos financeiros. Mas foi a partir de então que o empreendedor percebeu que havia um filão pouco explorado pelos bancos tradicionais: o crédito com garantia real para pessoa física.
A sacada transformou a Creditas na principal fintech de crédito do país, mas também colocou Furio diante de um dilema. Como não cair na tentação de disputar espaço entre os bancos digitais sem poder competir com a escala dos bancos tradicionais?
A Creditas nunca criou uma conta digital e só chegou mais perto disso na semana passada, com o anúncio de uma parceria pela qual o Nubank oferecerá os produtos da fintech para sua base de 40 milhões de clientes - e ficará com uma fatia de até 7,7% na empresa.
Em vez do caminho típico de um banco digital, a Creditas tem apostado num modelo de três verticais - imóveis, veículos e salários - que têm o crédito como pilar, mas não se limitam a ele. A ideia é atender o cliente na jornada que gera uma necessidade específica de recursos, seja a reforma de um imóvel, a compra de um carro ou um refinanciamento de dívidas mais caras, por exemplo. Sem grande alarde, a estratégia ajudou a fintech a alcançar uma carteira de R$ 2,195 bilhões na metade deste ano, alta de 120% em um ano.
“Ser dono de diferentes ‘pecinhas’ nos coloca em uma situação fantástica para inovar”, diz Furio, em entrevista concedida ao Valor antes do anúncio da parceria com o Nubank. “Estamos gerando as bases para a criação da empresa do futuro, que tem uma capacidade de se reinventar constantemente.”
Um dos passos mais ousados se deu em maio, quando a Creditas anunciou um plano de vender e financiar veículos. Foram criadas cinco concessionárias, além de um megacentro de reparos, num investimento de R$ 50 milhões. Pouco depois, fez um aporte de R$ 95 milhões na fabricante de motos elétricas Voltz - o Grupo Ultra também entrou na rodada, com R$ 5 milhões. O quebra-cabeças foi sendo montado também com a compra da insurtech Minuto Seguros e da plataforma de negociação de automóveis seminovos Volanty.
“A gente concedia empréstimo com garantia do veículo e, depois de um tempo, o cliente pré-pagava porque queria trocar o carro e ia embora”, afirma. “Percebemos que, participando de toda a jornada, isso não aconteceria.”
Ao atuar em todo o processo, a fintech tenta não só gerar recorrência, mas também aumentar o volume de operações. No caso do investimento na Voltz, Furio afirma que resultou do interesse da fintech no mercado de motos brasileiro, que é enorme, mas dominado pelos fabricantes e seus bancos próprios. “A parceria é quase um modelo de subscrição. As motos têm um chip, então a gente sabe o tempo todo onde estão, qual o estado da bateria, o jeito de conduzir do piloto. E estamos criando um serviço de aluguel de baterias”, afirma.
O novo jeito de operar surgiu pouco antes da pandemia na vertical imobiliária, a mais relevante para a fintech. Na época, passou a oferecer um serviço de assessoria para reformas - entrando em mais uma etapa da jornada dos clientes que tomavam empréstimos para fazer melhorias em casa.
Segundo Furio, não é com os serviços não financeiros que a Creditas vai ganhar dinheiro, mas eles ajudam a atrair clientes e a melhorar a experiência deles. “Não queremos ganhar dinheiro com a venda de carro, mas o crédito só pelo crédito não é sustentável. Em dez anos, qual será o diferencial competitivo de quem só oferta crédito? Por isso estamos criando um ecossistema de soluções”, diz.
A estratégia também envolve reforçar a oferta de empréstimos. Na vertical imobiliária, a fintech comprou, em janeiro, a BCredi, até então concorrente. E na vertical de crédito pessoal, já havia adquirido a Creditoo, startup que faz consignado para funcionários de empresas privadas e, em julho, anunciou acordo com a Icatu para oferecer crédito com garantia do plano de previdência privada.
Apontada no mercado como uma candidata a fazer uma oferta pública inicial de ações (IPO) em 2022, a Creditas não tem pressa, diz Furio. De acordo com ele, a empresa tem capital para seguir crescendo e não deve realizar uma rodada de investimentos neste ano. A fintech ainda roda com prejuízo e o fundador diz que também não será em 2021 que fechará no azul. “Agora nosso foco total é no crescimento da receita. Saímos de R$ 75 milhões por trimestre antes da pandemia e caminhamos para uma receita recorrente anual de R$ 750 milhões”, afirma.
No primeiro semestre, a fintech teve receita de R$ 294,3 milhões, com alta de 91%. O prejuízo foi de R$ 134,6 milhões, 50% maior que na primeira metade de 2020.