Caminhar pela São Bento, conhecida no centro de São Paulo como a "rua das financeiras", deixou de ser uma corrida com obstáculos. O exército de representantes de financeiras que prometia ofertas imperdíveis de crédito deixou de vez o calçadão. Hoje, é possível percorrê-la do início ao fim sem receber um único panfleto ou ter o caminho interrompido pelo profissional apelidado pelo setor de "pastinha".
A mudança, que começou a ser percebida nos últimos três anos, é um sinal da evolução do mercado nacional - a escalada do crédito consignado, que garantiu acesso a crédito com juro mais baixo (veja quadro ao lado), é visto como um dos motores dessa transformação. "Financiamento não é mais favor", diz o diretor do instituto Data Popular, Renato Meirelles. "A classe C está mais bem informada e não vê as financeiras como tábua de salvação."
As empresas reagiram à rejeição do consumidor ao "corpo a corpo" de maneiras diversas: algumas simplesmente tiraram os pastinhas de circulação, enquanto outras reviram por completo a estratégia de lojas, concentrando forças no varejo. A Fininvest, nas mãos do Itaú após a fusão com o Unibanco, reduziu os pontos de atendimento de rua a zero. O Ibi, do Bradesco, e a Losango, do grupo HSBC, também cortaram drasticamente o número de unidades.
A Losango iniciou a retirada dos representantes das ruas há três anos, segundo Hilgo Gonsalves, executivo-chefe da empresa. "Acho que foi uma mudança para melhor. Nesta abordagem, só vinha o cliente desesperado", diz. "Eu defendo que, se o cliente quer fazer um negócio, ele sabe onde nos encontrar. Fizemos pesquisas na época e vimos que não estávamos agradando."
Dados do instituto Data Popular mostram que a agressividade das financeiras acabou traduzida em aversão. Em uma pesquisa sobre o tema, 79% dos clientes da classe C se disseram "desconfortáveis" em tomar empréstimos em financeiras. O instituto aponta que a relação com outros produtos é mais harmoniosa: a rejeição ao cartão de crédito, por exemplo, é de 26%.
A resposta do Banco Central à atuação dos promotores de crédito acabou por vir perto do fim do ciclo de vida da profissão. O BC publicou resolução em fevereiro exigindo que os funcionários que fazem a abordagem corpo a corpo tenham vínculo com a instituição que representam, como um contrato de serviços terceirizados. Porém, deu prazo de até três anos para que as instituições se adaptem às regras.
"Vip". Enquanto os grandes bancos praticamente tiraram suas financeiras do varejo, trazendo parte do público antes atendido por elas para as agências tradicionais, outras instituições seguem com a aposta no formato de lojas, mas incluíram no atendimento cuidados tradicionalmente associados à alta renda.
A financeira Credicard modificou o layout das lojas para deixar o cliente mais à vontade e reduzir a exposição de quem negocia um empréstimo. "O desenho deixa o cliente de costas para a rua", conta o presidente da Credicard, Leonel Andrade. Outra prioridade é a resposta rápida : "A meta é que a pessoa saia da loja em 20 minutos, sabendo se o financiamento foi ou não concedido."
Para Andrade, um fator que reduz a rejeição às lojas da empresa é a marca Credicard, mais associada ao cartão de crédito do que aos serviços financeiros tipicamente populares. "A marca não é ligada a nenhum banco, além de ser largamente associada às classes A e B."
Em termos de "mimos", porém, o Paraná Banco, com sede em Curitiba, chega mais longe. Além de mandar cartões de aniversário à clientela, os gerentes vão à casa do solicitante fechar contratos. "O custo é alto, mas é uma forma de o cliente se lembrar da gente", diz o superintendente de marketing da instituição, Alexandre Maurizio Luz.