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Grandes bancos veem cenário ainda favorável ao crédito
É inevitável que o crédito se torne mais caro em 2021 diante do ciclo de elevação de juros colocado em curso pelo Banco Central. Mas, para os grandes bancos, a alta do custo do crédito não deve nublar o cenário ainda favorável para o avanço das carteiras, que deve registrar expansão na casa dos 10%, de acordo com as expectativas dessas instituições. E, exatamente como vem se desenhando nos últimos meses, serão as carteiras de pessoa física, principalmente as linhas voltadas para o consumo de bens duráveis, as que devem puxar o crescimento. Para as empresas, o avanço pode ser mais lento, embora os bancos vejam alguma reação também nesse segmento.
“Vemos um ritmo forte, e acelerando, de crescimento do crédito, tanto para pessoas físicas como para jurídicas”, afirma Cassio Schmitt, diretor de Produtos de Crédito do Santander. Os bancos não revelam as taxas de crescimento do crédito fora da divulgação do balanço trimestral, mas dizem que há sinais de que o desempenho no segundo trimestre é mais forte do que o observado nos três primeiros meses do ano, quando as instituições apresentaram um crescimento expressivo principalmente na carteira de pessoa física, puxada pelo crédito imobiliário e pelo empréstimo consignado.
O que está por trás desse cenário favorável é, principalmente, a surpresa positiva com o desempenho da economia e do consumo, o que justificou a elevação da projeção para crescimento do PIB para perto dos 5%. “De forma geral, as pessoas cortaram gastos no ano passado e não queriam tomar crédito, o que afetou bastante nossa capacidade de concessão”, diz Schmitt. "Isso está mudado".
Do lado da oferta, a melhora das condições econômicas representa uma oportunidade para que os bancos se tornem mais ativos, e passem a oferecer novos produtos a mais clientes. Isso, em um cenário em que a inadimplência também manteve-se abaixo do que se previa. “A economia mostra retomada, e os bancos também querem emprestar mais, têm margem para isso”, afirma Renato Lulia, diretor de Relações com Investidores e Inteligência de Mercado do Itaú Unibanco. “Continuamos a ver o crédito crescer a uma taxa de 10,5% este ano”, diz, referindo-se ao ‘guidance’ apresentado no balanço do primeiro trimestre.
Os bancos haviam se posicionado com robustas provisões no começo do ano para lidar com uma inadimplência muito maior do que de fato ocorreu. E isso torna o ambiente ainda mais favorável para o crédito, mesmo neste momento de taxa Selic em alta. Além da contração econômica ter sido mais branda do que se desenhava, a ação dos bancos, auxiliando os clientes na gestão de suas dívidas, contribuiu para esse quadro.
“Não é um mercado fácil. Mas os bancos estão muito acostumados a essa volatilidade”, diz Schmitt, do Santander, que trabalha hoje com uma estratégia equilibrada entre oferta de solução financeira e cobrança para conter riscos de inadimplência. Ele diz que o nível de inadimplência no Santander se estabilizou perto do observado no fim do primeiro trimestre - 3,1% para pessoa física, considerando-se atrasos superiores a 90 dias, e 1% para pessoa jurídica.
Já o Itaú criou o projeto Travessia, com medidas de suporte e reorganização do fluxo da dívida. Mas o banco também está atento ao fato de que as chamadas linhas “clean”, sem garantia, como crédito pessoal e cheque especial rotativo do cartão de crédito, também voltaram a crescer no segundo trimestre. Os clientes haviam reduzido o uso dessas modalidades, mais caras, ao longo de 2020 até o começo deste ano, quando pisaram no freio do consumo. E também porque contavam com apoio do auxílio emergencial e de iniciativas dos próprios bancos, como a possibilidade de um período de carência de juros para algumas linhas. À medida que esse suporte sai de cena e o consumo é retomado, naturalmente as linhas rotativas voltam.
Ainda assim, são as modalidades de prazo mais longo, como as de consignado e imobiliário, que devem continuar puxando a recuperação do crédito. No caso do Santander, cada uma dessas carteiras soma saldo de cerca de R$ 50 bilhões. Outra aposta do banco é a modalidade de crédito com garantia, de imóvel ou de veículo, cujo custo cai para menos da metade.
Para Isabela Tavares, da Tendências, as novas concessões de crédito devem crescer 4,8% este ano, acima do que se viu no ano passado (2%). Sua projeção leva em conta um avanço de 10,4% para o crédito para pessoa física, mas queda de 1,2% nos empréstimos para empresas. Na visão da especialista, a alta de juros será um limitador para a expansão. “A Selic pressiona no curto prazo a captação dos bancos, enquanto os spreads devem ser afetados pelo fim das medidas que barateavam as linhas de crédito.” Isabela observa que, apesar da retomada econômica, a recuperação do mercado de trabalho deve ser lenta, com a massa de rendimento tendo um avanço mais robusto só em 2022, quando a Selic deve estar rodando acima dos 6%. “O crédito vai crescer menos do que poderia por causa da alta dos juros”, diz.
Entre os bancos, a visão é que a alta da Selic já foi antecipada pelos contratos futuros de juros, que são os parâmetros utilizados na definição do custo do crédito de médio e longo prazo. “A alta da Selic para perto de 6% já está dada, já é considerada nas operações de médio prazo”, diz Leandro Diniz, Diretor do Departamento de Empréstimos e Financiamentos do Bradesco. Para se ter uma ideia, o contrato para janeiro de 2027, por exemplo, fechou ontem em 8,40%, mas chegou a superar os 9% em meados de abril.
No Banco do Brasil, a expectativa também é de que o crescimento da atividade se sobreponha à perspectiva de aumento do juro. O banco trabalha com uma expansão de 10% da carteira total de crédito, resultado que deve ser impulsionado por operações do Agronegócio. Segundo a vice-presidente de Controles Internos e Gestão de Riscos do BB, Ana Paula Teixeira, a carteira cresce 7% nos últimos 12 meses encerrados em maio, sendo que as operações do Agronegócio tiveram expansão de 45%.
O crédito para empresas continua sendo o maior desafio, em especial o voltado para pequenas e médias, que tiveram crescimento inferior a 1% no primeiro trimestre. Não à toa, o governo vai retomar o Pronampe a partir de junho. Já as linhas para grandes empresas têm trazido surpresas positivas. Segundo o Bradesco, a demanda por linhas de crédito para os setores de infraestrutura voltou a crescer nas últimas semanas. O Itaú também diz que o segmento de grandes empresas, que representa pouco mais de 40% da carteira do banco, surpreendeu positivamente nos primeiros meses do ano, quando o mercado de capitais ficou menos ativo, situação que tende a se reverter no segundo trimestre.