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ESG e riscos nas atividades bancárias

Fonte: O Estado de S. Paulo - 10/05/2021 às 11h05
A importância dos assuntos relacionados à economia sustentável, abarcados pela sigla em inglês ESG (Environmental, Social and Governance), tem estado em evidência em todos os setores. No bancário, há que se destacar a autorregulação adotada pela Febraban (Normativo SARB 14/2014), que foi atualizada no final de 2020, incorporando novos temas de ESG. Nessa esteira, o Banco Central do Brasil (“BCB”), alinhado aos movimentos de regulação e melhores práticas mundiais, publicou o Edital de Consulta Pública 85/21 (aberta para comentários até 05.06.2021), que traz propostas normativas visando ao aprimoramento do gerenciamento desses tipos de riscos.
 
A Consulta Pública prevê a inclusão, nas nomas já existentes sobre o dever de gerenciamento de riscos das instituições financeiras e outras (Res. 4.557/17) e nas normas sobre metodologia para apuração de Patrimônio de Referência Simplificado (Res. 4.606/17), os riscos ESG. A Consulta Pública propõe, ainda, uma nova Resolução, que determinará a obrigação daquelas entidades a estabelecerem uma Política de Responsabilidade Social, Ambiental e Climática (“PRSAC”), assim como a implementarem ações que persigam sua efetividade. Essa PRSAC deverá ser desenvolvida e implementada por todas as entidades, desde grandes bancos, passando pelas instituições de pagamento, fintechs e consórcios. A minuta de Resolução já esclarece que a PRSAC deverá ser compatível com os modelos de negócio, natureza de operações etc., e adequada à dimensão e à relevância da exposição aos riscos a que estão sujeitas as entidades reguladas pelo BCB nas suas atividades, dependendo do segmento (S1 a S5) em que se encontram. Desse modo, as PRSAC serão mais complexas para instituições financeiras que tenham, por exemplo, mais empregados, geração independente de energia, pegadas de carbono mais frequentes etc., e menos complexas para outras, como talvez uma fintech que tenha atividades físicas mínimas.
 
Não há dúvida que a iniciativa do BCB é oportuna, uma vez que incentiva o sistema financeiro nacional a permanecer na vanguarda da regulação e prudência. Note-se que a Consulta Pública não aborda e não pretende abordar o assunto tormentoso da eventual responsabilidade civil solidária das entidades mutuárias e financiadores com poluidores. Este tema é totalmente diverso do risco ESG a que as instituições financeiras e assemelhadas estão expostas.
 
Como é cediço, a Política Nacional de Meio Ambiente define a figura do poluidor indireto, aquele indiretamente responsável por atividade causadora de degradação ambiental. Existem posições doutrinárias de várias vertentes sobre a eventual responsabilidade ambiental das instituições financeiras como poluidoras indiretas em caso de danos ambientais perpetrados pelos agentes tomadores de crédito. Atualmente, porém, não há critérios legais objetivos para se estabelecer se e quando as instituições financeiras possam ser qualificadas como poluidoras indiretas para fins de responsabilização.
 
Em março deste ano, foi apresentado na Câmara dos Deputados, o projeto de lei no. 702/21, sobre esse tema. A proposta pretende inserir, na Política Nacional do Meio Ambiente (Lei Federal 6.938/81), previsões expressas que estabeleçam critérios para a consideração ou não de uma instituição financeira como poluidora indireta. Tais critérios seriam baseados no dever de diligência desses agentes, tanto prévia como posteriormente à concessão do “financiamento” ou da “assistência financeira”. O projeto elenca certas ações que as instituições financeiras deveriam adotar a fim de afastarem sua caracterização como poluidoras solidários, que vão desde a exigência e análise de autorizações e licenças ambientais, como condição para a liberação dos recursos financeiros, até o monitoramento periódico da conformidade da atividade do mutuário ou financiado e de processos judiciais e investigações a ela relativos.
 
O projeto de lei busca impor às instituições financeiras um dever de controle e monitoramento das atividades potencialmente poluidoras, que seria tipicamente da competência do Estado. O monitoramento ambiental demanda expertise própria, depende de poder de polícia, além de outros aspectos que não recomendam seja essa atividade transferida para o particular.  Ademais, é sempre útil lembrar que as atividades bancárias e financeiras são muito diversas. Se já é difícil encontrar o eventual nexo causal que poderia implicar responsabilidade ambiental do banco como poluidor indireto em empréstimos e financiamentos de empresas e projetos, muito mais difícil seria determiná-lo, por exemplo, em operações de mercado de capitais como nas emissões de ações, de debentures etc.
 
Feitas as distinções necessárias entre a normas de lege ferenda acima discutidas, concluímos que o BCB acerta em atualizar as regras de monitoramento de riscos pelos seus entes regulados, uma vez que esses riscos são atuais, recorrentes e de necessária atenção imediata. Quanto ao projeto de lei, acreditamos que não mereça prosperar, pelos motivos acima, restando aplicável a Política Nacional do Meio Ambiente e legislação específica aplicáveis, para a responsabilização casuística do poluidor indireto, seja ele instituição financeira ou outras entidades e pessoas de qualquer natureza.
 
*Marina Monne e José Augusto Martins, sócios das áreas de direito ambiental e bancário e negócios do Renno Penteado e Sampaio Advogados

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