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Arrependimento de Bolsonaro é o motor da incerteza sobre a autonomia do Banco Central
A expectativa de enfrentar um ano eleitoral com inflação em alta e sem controle sobre a política monetária aumentou, no presidente da República, o arrependimento pelo aval à autonomia do Banco Central. É este o pano de fundo da incerteza que passou a pairar sobre o futuro da mecanismo que foi aprovado pelo Congresso em fevereiro e hoje é alvo de uma ação de inconstitucionalidade.
A ação, de autoria do PT e do Psol, cairia no limbo não fosse o interesse de Jair Bolsonaro em reverter a medida. O parecer do procurador-geral da República, Augusto Aras, julgando procedente a inconstitucionalidade da lei, harmonizou-se com o interesse do presidente. O sinal de alerta, porém, foi ligado com o voto inaugural na abertura do plenário virtual na sexta-feira.
Primeiro a votar, o ministro Ricardo Lewandowski acolheu a manifestação de Aras, concordando com a tese de que o projeto de autonomia do Banco Central deveria ter sido de iniciativa do Executivo e não do Congresso, como se deu com a lei aprovada. Foi aí que o ministro Luís Roberto Barroso resolveu pedir vista.
A suspensão do julgamento por pedido de vista costuma ocorrer quando há incerteza sobre o resultado. Barroso prometeu devolver a vista com brevidade, mas o julgamento também pode ser pautado no plenário presencial e ser objeto de novo pedido de vista.
O presidente do Banco Central, Roberto Campos, fez, ao longo das últimas semanas, visitas aos ministros para explicar as razões pelas quais acredita que o projeto deve ser mantido e os riscos de sua derrubada. Não foi recebido pelo ministro Edson Fachin, que tem uma política restrita de audiência às partes. Foi o voto de Lewandowski, porém, que acendeu o alerta e levou a Febraban a entrar no jogo para convencer os ministros a não derrubar a lei.
Emissários do presidente têm usado a vaga a ser aberta no Tribunal Superior Eleitoral para barganhar voto no Supremo contra a autonomia do BC. Ministros do Supremo e o presidente da Câmara, Arthur Lira, disputam influência sobre a indicação. A insegurança no placar aumenta com a perspectiva de o presidente fazer sua segunda indicação para o Supremo a partir da saída do ministro Marco Aurélio Mello em 5 de julho. A expectativa, entre operadores do mercado, porém, é que o ônus pela manutenção da autonomia do BC recaia hoje mais sobre o Congresso.
O projeto foi o primeiro a ser aprovado pela legislatura presidida pelo deputado Artur Lira (PP-AL) numa sinalização de aproximação com a pauta liberal. A autonomia do Banco Central foi aprovada na primeira semana dos trabalhos legislativos e sancionada pelo presidente da República 15 dias depois.
De lá para cá, o compromisso assumido por Lira foi atropelado pelo inchaço das emendas parlamentares, que pressionam o equilíbrio fiscal, e da aprovação de projetos como a MP da Eletrobras, reserva de mercado para os liberais de fachada. A autonomia do BC restava como um poucos baluartes da pauta anunciada.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG) manifestou-se, esta semana, em defesa da manutenção da lei aprovada em fevereiro deste ano. Lira ainda não.