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Imprensa
Com juros altos e restrição de bancos, cooperativas de crédito avançam

SÃO PAULO ­ Para reformar um imóvel e instalar seu novo empreendimento — um centro de cultura oriental, em São Paulo, dedicado ao ensino de arte marciais e idiomas, além de tratamento de acupuntura —, o empresario Rômulo Mallet Rocco, de 35 anos, precisava de R$ 300 mil. Ao longo do ano passado, ele peregrinou por vários bancos e esbarrou em muita burocracia e obstáculos, por se tratar de uma empresa nova. Com as portas fechadas nos bancos,
passou a procurar uma cooperativa de crédito. Pesquisou e conversou com amigos até encontrar uma instituição instalada na Avenida Paulista. Lá, apresentou seu plano de negócios e formalizou o pedido de empréstimo.
 

— O gerente fez questão de conhecer o prédio que eu queria reformar. Depois fez simulações para saber como eu poderia pagar as prestações, e até se o meu plano de negócios era viável. Foi um atendimento mais pessoal e humano mesmo. E consegui os recursos com uma taxa de juros de 2,6% ao mês, muito abaixo
da praticada pelos bancos — diz Rocco, lembrando que o centro funciona desde outubro passado e já tem 100 alunos.

 

No ambiente atual de crédito escasso e com os bancos mais restritivos para fazer empréstimos, as cooperativas de crédito estão se tornando uma alternativa para empresas como as de Rocco, sem histórico de crédito, ou a pessoas
físicas que buscam empréstimos, seja para tocar seus negócios ou desafogar o orçamento apertado.

 

Dados do Banco Central mostram que 8,7 milhões de brasileiros já são “cooperados” — clientes e ao mesmo tempo sócios dessas instituições. Contingente que dobrou nos últimos cinco anos, segundo o BC, que é responsável pela regulação e fiscalização das cooperativas.

 

O volume de recursos emprestados pelas cooperativas também cresceu quase três vezes em cinco anos: saltou de R$ 26 bilhões, em 2010, para R$ 73 bilhões no fim do ano passado. Com esse volume de empréstimos, juntas, as cooperativas de crédito do país já têm porte equivalente ao do sexto maior banco do país por saldo de carteira, segundo dados levantados pela consultoria Austin Ratings.

 

MAIS DE MIL INSTITUIÇÕES NO PAÍS

 

Neste ano, apenas, enquanto os bancos amargaram queda de 6,7% nas concessões de crédito no primeiro semestre, as cooperativas tiveram crescimento de 8,3% no mesmo período.

 

— Enquanto os bancos estão fechando a torneira do crédito, as cooperativas vão no sentido contrário. A proximidade com os cooperados traz mais confiança e facilita a análise de risco, já que ele torna­se sócio do negócio — explica Thiago Borba, coordenador de crédito da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB).

 

Originalmente direcionadas ao crédito agrícola, hoje há no país cooperativas de médicos, empresários entre outras, uma vez que oBanco Central autorizou há alguns anos a livre admissão nessas instituições. Assim, qualquer trabalhador pode se tornar cooperado, mesmo que não pertença à categoria profissional representada. Para se tornar cooperado, é preciso um aporte de capital e o interessado tem de morar próximo da área de atuação da cooperativa.

 

— O brasileiro ainda desconhece as cooperativas, especialmente nos grandes centros urbanos onde o volume de depósitos ainda é muito pequeno — diz Borba, da OCB.

 

Atualmente, segundo a OCB, existem mais de mil cooperativas espalhadas pelo país, com cerca de 5,5 mil postos de atendimento. Muitas estão em municípios onde nem existe agência bancária. Como não têm fins lucrativos, as cooperativas podem emprestar a juros mais baixos do que os dos bancos.

 

O que explica a taxa de juros de 2,6% conseguida pelo empresário Rômulo Rocco. Nos bancos, a taxa média de empréstimos para pessoas jurídicas hoje está em 4,6%. A taxa de cadastro para iniciar relacionamento, por exemplo, custa em média R$ 5 nas cooperativas, enquanto nos bancos a média é de R$ 15.

 

— O dinheiro que emprestamos vem dos depósitos dos associados — diz Jaime Basso, presidente da Sicredi Vale do Piquiri, lembrando que os cooperados rateiam os ganhos obtidos na gestão financeira das operações, se o resultado for positivo. O ‘spread’ obtido nas operações serve para pagar os gastos operacionais da cooperativa, como estrutura, funcionários, tecnologia. O resultado líquido, após os custos, chamadas sobras, é que é distribuído aos cooperados.

 

Basso diz que o fato de os cooperados serem sócios do negócio torna a inadimplência baixa, sem revelar números. Nos bancos, a inadimplência vem crescendo desde o ano passado, com o aprofundamento da recessão e aumento do desemprego, e está atualmente em 3,5%.

 

O risco do cooperado é a empresa falir ou ter prejuízo, situação que exigirá a cobertura dos demais associados. Mas, nos últimos anos, não há registros de liquidações judiciais de cooperativas, de acordo com o
BC.


O caso mais conhecido de quebra de uma dessas instituições foi o da Cooperativa Agrícola de Cotia (CAC) nos anos 90. Ela chegou a ser apontada como a maior “cooperativa do mundo”. Seu próprio gigantismo, apostas erradas em investimentos e a benevolência com sócios que não quitavam débitos levaram a CAC à falência, deixando
um rastro de dívidas de mais de R$ 3 bilhões.


Para dar mais segurança aos cooperados, foi constituído o Fundo Garantidor do Cooperativismo de Crédito, que cobre até R$ 250 mil por recursos aplicados pelos cooperados em caso de quebra da instituição, assim como acontece com os bancos. De acordo com o Banco Central, as cooperativas também têm limites operacionais, com regras semelhantes as de Basiléia para os bancos. Além disso, informa o BC, para ser autorizada a operar, a cooperativa precisa da aprovação do plano de negócios, com viabilidade num horizonte de três anos, e “inexistência de restrições em relação aos administradores”.


— Elas são mais flexíveis para oferecer crédito, mas isso não significa que não exijam garantias do tomador. Além disso, muita gente não sabe que pode abrir conta, fazer seguros ou investimentos, como fundos ou poupança. Ou mesmo ter cartão de crédito nas próprias cooperativas, com taxas mais atraentes — diz Miguel Ribeiro de Oliveira, diretor de pesquisas econômicas da Associação Nacional dos Executivos de Finanças (Anefac), lembrando que para pequenas empresas que têm muita dificuldade de obter recursos nos bancos, as cooperativas são uma opção interessante para obter empréstimos e até mesmo capital de giro.

 

PARTICIPAÇÃO NO SISTEMA FINANCEIRO É DE 3%

 

Rosimeire Marcondes, gerente financeira da Assurance IT, uma empresa de serviços de tecnologia, conta que foi buscar capital de giro numa cooperativa. Como a empresa trabalha com muitos prestadores de serviços e precisa pagar os funcionários antes de receber dos clientes (que faturam o pagamento em até 90 dias) o caixa às vezes fica vulnerável. Nos bancos, ela encontrou muita resistência. Desde 2014, já foram três empréstimos para capital de giro: de R$ 400 mil, R$ 1 milhão e R$ 1,8 milhão:

 

— Neste último, demos como garantia um imóvel. E a taxa de juros foi bem interessante, de 1,7% ao mês.

 

No mercado, segundo a Anefac, a taxa média de juros para capital de giro está em 2,6%.

 

Mesmo assim, Rosimeire ressalta que, até a liberação do dinheiro, o processo de análise de crédito foi bem criterioso e levou tempo.


Nos próximos anos, a expectativa é que as cooperativas ganhem mais participação no sistema financeiro. Hoje, elas representam apenas 3%. Até 2025, o desafio é atingir dois dígitos.


— Em países como a Alemanha, o total de ativos das cooperativas já representam 30% dos ativos do sistema financeiro. Na França, já chegam a 50% — diz Borba, da OCB.

 

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