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Imprensa
Para Castelar, é possível uma rápida reversão das expectativas


A paralisia de resposta da política econômica à crise e a consequente falta de horizonte de melhora são os principais responsáveis pelos resultados fracos do Produto Interno Bruto (PIB) divulgados ontem pelo IBGE. A boa notícia é que as expectativas podem ser revertidas rapidamente caso governo e Congresso ­ que hoje parecem "simplesmente fazer de conta" que a recessão não existe ­ mudem de postura.


A avaliação é de Armando Castelar Pinheiro, coordenador de economia aplicada do Ibre­FGV e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). "Não está escrito em lugar nenhum que necessariamente continuaremos com esse desempenho negativo. Agora o que muita gente enxerga é que não está vindo o que vai fazer mudar."

O pesquisador usa a expressão "dominância política" para descrever a atual situação do país que, para ele, se refletiu nos dados do PIB de julho a setembro: sem reação do governo à altura do problema, todos os agentes têm como principal preocupação manter sua liquidez. Para não comprometer seu caixa, as empresas não investem, as
famílias preferem não consumir e os bancos não liberam crédito. A seguir, os principais trechos da entrevista.


Valor: Como o sr. avalia os resultados do PIB do terceiro trimestre?


Armando Castelar: Os dados vieram um pouco piores do esperado e às vezes são afetados por fatores de dessazonalização, mas de qualquer forma é uma queda muito forte, depois de um trimestre em que o PIB já tinha caído 2,1%. É algo brutal. O investimento mostrou péssimo desempenho e a indústria de transformação sofreu
mais um trimestre de fraco nível de atividade. O PIB mostra uma economia que está se contraindo de maneira muito forte e bastante espalhada.


Valor: Até que ponto o sr. acha que os números negativos podem ser explicados pela crise política?


Castelar: O que está acontecendo é uma crise de credibilidade, de confiança mais do que de credibilidade, talvez. Estamos vendo a economia piorar, um problema fiscal muito sério e não há resposta à altura. Isso assusta todo mundo, que corre para ficar líquido. As empresas não querem gastar dinheiro em investimento, porque isso vai
comprometer caixa e exigir financiamento, os consumidores preferem não consumir, os bancos preferem não emprestar. A crise política, se definida só como discussão no Congresso, é apenas parte do problema. Também há a crise gerada pela falta de resposta da política econômica.


Valor: Quais respostas eram esperadas e foram frustradas?


Castelar: Principalmente em relação às contas públicas. O déficit público como um todo aumentou muito, a dívida pública começou a subir num ritmo muito forte e, se continuar subindo nesse ritmo, vai ficar impagável. Então, aí você pode imaginar o desarranjo de uma economia que é totalmente lastreada em dívida pública.


Valor: Devemos ter mais um rebaixamento do rating de outra agência de risco por conta disso?


Castelar: Acho muito provável.


Valor: A indústria começou a recuar antes dos demais setores e não dá sinais de estabilização...


Castelar: A indústria tem um problema de competitividade muito sério, refletido em indicadores de custo unitário do trabalho, o que está relacionado à queda produtividade. Tentamos resolver isso da maneira errada, protegendo o setor. A indústria também sofre com o fato de não termos feitos acordos comerciais, o que não tem permitido que ela aproveite o câmbio, que está muito mais desvalorizado do que a média histórica. Ficamos muito isolados e isso dificulta uma reação.


Valor: Os investimentos recuaram pelo nono trimestre consecutivo. O PIB potencial está em queda?


Castelar : Muito provavelmente. Isso é de se esperar com menos investimento, mas também com um desarranjo grande na economia. A produtividade do trabalho está caindo. A minha avaliação, a partir da queda do investimento, da falta de investimento em infraestrutura e do próprio desarranjo quando há queda muito generalizada e sem perspectiva clara de para onde você vai sair, é que o potencial de crescimento cai.


Valor: O resultado do 3 º trimestre traz desafios para a política monetária? O que o sr. acha da tese de que estamos sob dominância fiscal?


Castelar: Acho que a gente não está. Cunhei um termo em algo que escrevi, falando que estamos mais sobdominância política do que fiscal. A política fiscal continua expansionista. A falta de credibilidade bate no dólar,a taxa de câmbio acrescenta pressão [na inflação] e muitas empresas reagem reduzindo o nível de atividade. É um
quadro complicado para a política monetária, mas não elimina o fato de que a inflação continua preocupação bastante relevante.


Valor: Quando o país vai voltar a crescer?


Castelar: Mesmo que nada aconteça, a economia vai cair quase 2% no próximo ano por causa do efeito estatístico de 2015. Agora, o que vai ocorrer no trimestre contra trimestre depende da política econômica. Hoje, parte importante do "establishment" político simplesmente faz de conta que a crise não existe. A notícia boa é que uma mudança de postura pode gerar mudança de expectativas com bastante rapidez. Não está escrito em lugar nenhum que necessariamente continuaremos com esse desempenho negativo. Agora, o que muita gente enxerga é que não está vindo o que vai fazer mudar.


Valor: O que o sr. acha que pode fazer esse quadro mudar?


Castelar: O principal problema hoje é o fato de que os interesses políticos estão muito voltados para a eleição de 2018. O governo tem que acordar de alguma maneira para isso. Difícil dizer o que vai fazer ele acordar, talvez uma piora do mercado de trabalho, que vai sentir mais em 2016. Este ano não sentiu, o emprego e a renda ficaram
parados. Isso não vai ser tão bom no próximo ano e pode aumentar a pressão para que se comece a olhar a crise e se comece a fazer uma coisa um pouco mais séria, com mudanças que reduzam o crescimento do gasto público.

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