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Imprensa
BTG não pode ser implicado na Lava-Jato


Desde a prisão do banqueiro André Esteves, na manhã da última quarta, e a operação de busca e apreensão na sede, o BTG Pactual, na avenida Faria Lima, transformou-se num grande gabinete de crise. No lugar das tradicionais reuniões com clientes, as salas do 14º andar passaram a abrigar infindáveis teleconferências e encontros entre sócios, acionistas e reguladores para monitorar a situação de liquidez do sexto maior banco privado do país, preservar negócios e traçar os rumos em meio a um cenário de estresse sem precedentes na história do banco. A tensão é notável, embora todos tentem transmitir um ar de tranquilidade e até de descontração.


Foi nesse clima que o economista Persio Arida, sócio do BTG Pactual e apontado ainda na quarta-feira como CEO interino, recebeu o Valor na tarde de ontem para uma entrevista espremida entre reuniões, com duração de 35 minutos e que teve seu início retardado por mais de uma hora, enquanto outras questões urgentes eram resolvidas.


Questionado se o banco estaria à venda, ele foi enfático: "Certamente não".


Sobre o suposto envolvimento do banqueiro e controlador do BTG com os planos de impedir as investigações da Operação Lava-Jato, Arida disse acreditar não ser plausível. "Não sei como julgar. Não temos nenhuma base para imaginar que algo similar [envolvimento de André Esteves] aconteceu."


Ele negou que o banco possa ser implicado nas investigações, mas revelou que os sócios decidiram fazer um pente-fino de todas as operações que possam estar "remotamente vinculadas" à prisão do banqueiro.


Apontado como interino, Arida não discute neste momento sobre uma eventual sucessão no banco. Leia abaixo a entrevista.


Valor: O banco está à venda?


Persio Arida: Certamente não.


Valor: O banco pode ser implicado nessa investigação?


Arida: Fomos tomados de surpresa com tudo que aconteceu. Não vejo nenhuma maneira pela qual o banco possa ser implicado nesse processo.


Confesso que não entendemos o que se passa exatamente. Mas trata-se de um equívoco, confiamos na Justiça e, como cidadão, tenho confiança que a Lava-Jato veio para o bem do país e que a verdade vai se estabelecer rapidamente.


Valor: O sr. acha que isso [a prisão] é um equívoco da Lava-Jato?


Arida: Não sei como julgar. Não temos nenhuma base para imaginar que algo similar [envolvimento de André Esteves] aconteceu. Não nos parece plausível. Vamos aguardar. Temos confiança na Justiça, de que tudo vai se esclarecer rapidamente e a situação vai se normalizar. O banco não está afetado de forma nenhuma. Por precaução nossa, dever fiduciário, estamos conduzindo uma revisão sistemática de tudo, as operações do banco, de tudo que possa estar remotamente vinculado a esse processo. Inclusive com a presença de membros do conselho de administração independentes. Mas só para ter certeza do que nós previamente já temos muita segurança, de que não há nada no banco.


Valor: Estão revendo operações?


Arida: Temos que olhar novamente as operações uma a uma, cuidadosamente.


Valor: Que tipo de operações?


Arida: Quaisquer operações que envolvam qualquer conexão com esse episódio.


Valor: Qual episódio?


Arida: O episódio prisão do André, obviamente. Temos certeza que não tem nada, mas como somos uma companhia aberta, com investidores internacionais, o procedimento de governança recomenda uma atitude desse tipo.


Valor: Mas, por exemplo, a operação da BR Distribuidora...


Arida: Mais detalhes eu não vou lhe dar agora. Não é uma preocupação nossa. A motivação é governança e qualquer companhia aberta faria.


Valor: O caso específico que aparece na gravação [que Bernardo Cerveró fez de conversa com o senador Delcídio Amaral (PT)], sobre o embandeiramento de postos de gasolina. Essa operação não é dentro do banco, é?


Persio Arida: Nunca foi feita pelo banco.


Valor: Ela é de sócios em comum [com o banco]. Quais sócios, além de André Esteves?


Arida: Eu não estou autorizado a dar essa informação. Posso te dizer com certeza que não é uma operação do banco. Posso dizer também que foi um investimento extremamente mal sucedido, tanto é que os sócios da companhia lançaram como prejuízo.


Valor: Sobre outras operações do banco que envolvem Petrobras, a joint venture com a estatal para operar na África, aí sim é operação do banco?


Arida: Essa é operação do banco. Tem fundos, outros investidores também, além de uma parcela direta do banco.


Valor: Sete Brasil também é um investimento do banco e clientes?


Arida: Formalmente é um fundo e tem banco e investidores. Sete Brasil é um caso de project finance concebido pela Petrobras que pareceu extremamente rentável e atrativo. Todo setor bancário brasileiro participou, alguns bancos só deram crédito, outros só ações, alguns bancos deram os dois. Foi certamente o pior investimento da nossa história.


Valor: É possível dissociar a imagem do banco da imagem de André Esteves?


Arida: Essa pergunta tem sido feita muitas vezes. Claro que André Esteves, pela trajetória empresarial, pelo carisma, pela energia, foi sempre a face mais emblemática do banco. Os sócios todos sempre acharam conveniente que o banco fosse cristalizado numa face. Mas quem toca o banco é a "partneship" [sociedade]. O banco é muito maior que a figura emblemática. O modelo de partnership praticamente desapareceu nos bancos no mundo, com as aberturas de capital. Nós optamos por uma rota diferente, inovadora, de manter o partnership. Ninguém vendeu quando houve a abertura de capital. Fizemos um aumento de capital, não houve oferta secundária e mais de 80% das ações são do partnership. Então, nós tocamos sociedade do mesmo jeito que tocávamos antes. Essa é a força do BTG Pactual, os sócios estão todos juntos, trabalhando normalmente.


Valor: Alinhados?


Arida: Completamente alinhados. São 200 sócios, estrangeiros e brasileiros, e os estrangeiros são crescentes porque o banco se internacionalizou.


Valor: Mas essa partnership tem uma peculiaridade. Porque, quando se olha a composição acionária, é possível ver que André Esteves tem uma participação muito superior à dos demais sócios [28,4% do capital da holding controladora é de Esteves. Os outros dois maiores sócios, Roberto Sallouti e Marcelo Kalim, têm 5,6% cada um].


Arida: A legislação brasileira obriga que você identifique o controlador de um banco. O André é o controlador do banco, sem dúvida. Mas é muito diferente a figura do controlador da figura que a gente tem em mente do dono do banco. Sei que frequentemente o André aparece como o dono do banco no jornal, o que dá a impressão de que o dono do banco decide discricionariamente sobre todo e qualquer assunto, como os banqueiros de antigamente. Como o Gastão Vidigal [do Mercantil de São Paulo, já morto], em que o banco era ele, ele decidia tudo.


Valor: Aqui não é assim?


Arida: Aqui não é assim. Nem do ponto de vista societário, nem de como a gestão é feita. A gestão é do partnership. Sempre foi assim.


Valor: Mas o André Esteves tem uma golden share [ação que concede poderes especiais ao controlador].


Arida: Para que serve uma golden share? Quando você tem menos de 50% [do capital ordinário na mão de um sócio], é como você define o controle. Caso contrário, você não teria controle definido.


Valor: Mas isso dá o controle. Quais são os direitos atrelados à Golden share?


Arida: Infelizmente, o documento da partnership não é público, é privado. Deixa observar algo: uma coisa é o controle formal, outra é como as coisas de fato funcionam. Qualquer sociedade tem um acordo implícito de acionistas. Aqui, essa cultura tem 30 anos e transcende qualquer coisa que esteja escrita no papel. Tem uma expressão, de quando se formou o BTG Pactual, que é até muito ruim: aqui é a ditadura do argumento. Eu não gosto da expressão, mas no fundo é isso, se um sócio tiver uma opinião melhor que a sua e defender essa opinião, o interesse de todos é que aconteça o melhor.


Valor: Na prática isso supera um acordo de acionistas?


Arida: Certamente. Não é que vá contra o acordo de acionistas, de maneira nenhuma, mas o modus operandi é que você respeita opiniões. Às vezes tem um sócio pequeno, que tem opiniões muito firmes sobre alguma coisa e convence os outros e todos seguem a opinião dele. Não tem importância que ele tenha poucas ações.


Valor: Como foram os pedidos de resgate na quarta-feira, dia da prisão?


Arida: Eu já vi muita coisa na minha vida. Já fui diretor da área bancária do Banco Central, presidente do Banco Central, trabalhei muitos anos no Itaú Unibanco e como macroeconomista estudei os fenômenos financeiros a vida inteira. Houve saques, sem a menor dúvida, mas aquém do que eu teria imaginado que teria. Dada a repercussão do caso, me surpreendeu para menos. Quando pensei a respeito, há uma boa explicação: esse cliente nos conhece há muito tempo, nos acompanha, conhece, confia. Os saques acabaram sendo muito menores do que eu imaginava dada a magnitude do problema.


Valor: O senhor se refere às duas coisas, tanto liquidez do banco como os fundos?


Arida: O saque dos fundos aconteceram, mas não afetam o banco por definição. Saques sobre o banco existem, mas nós tivemos sempre uma liquidez elevada. Na nossa última divulgação de resultados, houve muita pergunta do sentido de se manter um nível de liquidez tão elevado e um volume de depósitos elevados, dado o fato que os depósitos rendem menos que outras aplicações.


Valor: Mas vocês imaginavam que poderiam ter um evento de liquidez?


Arida: A prisão do André foi um evento que nos pegou de surpresa. Ninguém nunca pensou remotamente que poderia acontecer algo assim na companhia. Estamos perplexos com o evento, mas nossos níveis de liquidez são mais que adequados para enfrentar a questão.


Valor: O caixa é de R$ 40 bilhões?


Arida: Eu não posso comentar caixa pelo sigilo bancário. Essa era a posição de caixa no fechamento do último trimestre e foi o que foi divulgado no balanço.


Valor: Tivemos informação de um volume de saques pequeno no banco [sem contar fundos], em torno de R$ 2 bilhões.


Arida: Os saques foram muito aquém do que eu teria imaginado.


Valor: Qual foi a reação dos clientes de fora do Brasil, em especial do BSI, na Suíça?


Arida: O BSI é um mundo diferente. O banco existe há 140 anos, em outra jurisdição, com uma base de clientes muito diversificada e basicamente pessoa física. Tem um funding muito estável e uma legislação insulada ele é percebido como ser à parte porque é um ser à parte. Temos zero de preocupação com o BSI, nenhuma.


Valor: Mas os clientes questionaram? Houve pedido de resgate lá?


Arida: Por sigilo bancário, eu nem tenho acesso a essa informação daqui do Brasil. Essa é uma informação acessada na Suíça. Nós obviamente conversamos com os reguladores suíços. O chairman do banco, que é suíço inclusive, prestou as informações aos reguladores e, depois de conversar com o chairman, tive a informação de que a situação está absolutamente normal lá.


Valor: O banco tinha plano de contingência?


Arida: Plano de contingência, sem dúvida temos. Todos os bancos têm.


Valor: Em que medida os fundos do BTG estão expostos ao risco banco?


Arida: Não estou autorizado a dar o número exato, mas, por postura nossa, quando existe essa exposição é em níveis muito baixos. Adotamos limites máximos, caso contrário daria impressão equivocada ao cliente. Uma coisa é o cliente querer correr risco BTG Pactual e comprar CBD e LCI.


Valor: A regra diz que o limite é de 20% do fundo em papéis do banco. Vocês operam abaixo desse limite?


Arida: Bem abaixo.


Valor: Sobre a base de captação, há um volume elevado de depósitos à vista e com vencimento de curto prazo. Como se explica, já que não é um banco de varejo?


Arida: Isso reflete a liquidez consolidada do BTG como um todo, e o BSI em particular é extremamente líquido. Como a taxa de juros da Suíça é negativa, é melhor para os clientes deixar o dinheiro no banco aplicado a taxa zero do que pagar também a taxa de administração em um fundo; e por isso tem muito depósito à vista.


Valor: E sem contar o BSI, qual o perfil de captação do banco?


Arida: Nós reportamos o consolidado e eu não posso decompor esse consolidado.


Valor: Como foi a interação com o Banco Central e com os outros reguladores?


Arida: Tomamos atitude pró-ativa de conversar com reguladores. Tanto no Brasil, como no Chile, na Suíça e em todos os outros países em que temos entes regulados. Explicamos a todos a situação e a postura dos reguladores tem sido extremamente positiva. O próprio Banco Central do Brasil emitiu comunicado a esse respeito. Estamos em contato constante. Eu já fui regulador, então sei a importância que tem quando o regulado tem uma postura ativa e contata o regulador, conta como está sua posição exatamente.


Valor: Mas qual explicação foi dada?


Arida: Não precisa de explicação. Você teve um evento, que foi a prisão do CEO e, naturalmente, você tem saques nessa circunstância. Isso não precisa ser explicado. Mas me surpreende que eles foram muito menores do que eu teria imaginado.


Valor: Quão menos?


Arida: Em algum momento para frente eu posso contar.


Valor: Como estão as linhas de bancos estrangeiros para o banco?


Arida: Essas linhas têm ficado completamente estáveis, que é o que se poderia imaginar. Na verdade elas são condicionadas ao preço de ativos.


Valor: Mas poderia ter havido corte dos limites...


Arida: Poderia, não houve. Está seguindo o trâmite normal.



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