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Imprensa
BC não deve abrir a porta a um ataque especulativo clássico

Em 4/5 (primeiro dia útil do mês), a taxa de câmbio era R$ 3,0754 (taxa ptax para a venda, calculada pelo BC). Em 23 de setembro, a R$ 4,1041, aumento de 33,4% em quatro meses, antes de atingir R$ 4,24 pouco depois.

Quando o dólar chegou a esse valor, o presidente do Banco Central anunciou disposição em intervir, apoiado pelo Tesouro, que passou a recomprar títulos de detentores temerosos de perdas de capital importantes.

Nos anos 90 produziu-se extensa literatura sobre crises cambiais, inspirada pela sequência de crises entre o ataque à libra e à lira, no início da década, e a crise asiática ao final. Essas crises se deram em regimes de câmbio fixo ou "atrelado" ("pegged"), que têm em comum o compromisso das autoridades nacionais em defender cotações ou intervalos de variação.

Nessa situação, um ataque especulativo acontecia quando um especulador comprava moeda estrangeira usando moeda nacional (no caso de não residentes, esse movimento era antecedido por uma forte demanda por crédito na moeda nacional), para forçar a autoridade a conceder uma alta da taxa de câmbio e abocanhar ganhos.

Se o BC do país atacado dispusesse de amplas reservas, poderia neutralizar o ataque. Se não, a desvalorização cambial se tornava inevitável.

Em regimes de câmbio flutuante, um ataque especulativo não seria possível, porque não haveria ninguém a defender uma dada cotação da moeda estrangeira, cujo preço variaria com as pressões de demanda (ou de oferta).

Mas, mesmo sem ataques especulativos, crises cambiais continuam possíveis, e o Brasil parece ter passado (estar passando?) por uma.

A literatura sobre crises cambiais definia uma crise por um coeficiente de perda de reservas (câmbio fixo) ou pela intensidade da desvalorização (flutuante). A flutuação vivida aqui nas últimas semanas com certeza se enquadraria nesse critério.

Com câmbio flutuante, se espera que uma crise tenha fôlego curto, porque as taxas variam continuamente, diminuindo o prêmio dos atacantes bem-sucedidos, e porque o afastamento da taxa de câmbio do que se considera a taxa "normal" leva muitos a mudar sua visão de touros (apostando na alta do dólar) para ursos (apostando na queda).

É aqui que a crise cambial corrente assume um caráter "sui generis" —parece muito mais ligada ao enfraquecimento político da presidente Rousseff do que aos problemas da economia.

Seu primeiro mandato redundou numa economia estagnada e no uso de instrumentos de intervenção percebidos como uma distribuição de favores mais do que uma ação racional coerente.

A incapacidade da presidente de definir (e aderir a) uma estratégia de gestão das dificuldades econômicas está na raiz do problema, mas não o esgota. Seja qual for a escolha da presidente, enraizou-se, e não por acidente, a percepção de que ela não é capaz de implementá-la, face a um Congresso hostil, uma oposição furiosa e, principalmente, uma base parlamentar esfacelada e dubitativa.

Seus oponentes não fazem concessões, mas seus apoiadores são condicionais.

Nesse quadro, a demanda por dólares se torna precaucionaria, uma porta líquida de saída para o caso de se chegar a um impasse insolúvel no campo político.

Em um contexto assim, torna-se difícil a interação entre ursos e touros, já que não há como definir o que seria a taxa "normal" de câmbio para o horizonte próximo.

Uma intervenção do BC como "market maker", vendendo dólares, provavelmente pioraria as coisas —não ajudaria a situação política e comprometeria o banco com uma dada taxa ou intervalo (mesmo que ele negasse), abrindo a porta para um ataque especulativo "clássico".

A chave, aqui como em outras áreas, está em que o impasse político não pode durar indefinidamente, sob o risco de comprometer a operação da economia como um todo, paralisado pela incerteza do futuro imediato. 


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